quinta-feira, maio 04, 2006

Vive le Québec libre!





Antunes Ferreira
Maio já está nos carris. Junho não tarda e Julho perfila-se no horizonte. Poderão aqueles a quem me dirijo pensar que endoideci ou, no mínimo, me tornei num calendariodependente. Porquê este arrazoado sobre o Verão que se aproxima? Porque razão o gajo não acrescentou ao escrito o mês de Agosto e o de Setembro? Que se saiba o Estio usa e abusa deste hábito: começa a 21 de Junho e fina-se a 23 de Setembro. Porém, com todas as mudanças que se verificam – e a todos os níveis...

Eu sei e confesso que sou um tanto estúrdio. Mas, daí a entrar pelo campo da loucura vai um larguíssimo passo; nem que usasse as botas das sete léguas, como o Polegarzinho. Maluco sou, mas no bom sentido da palavra. Adoro trocadilhos, sei milhões de anedotas e conto-as menos mal, entusiasmo-me com as tiradas irónicas que introduzo em muitos dos textos que subscrevo. Sou, o que se chama, um gozão.
Deitem-se para trás das costas (estranha expressão que se arreigou na linguagem. A parte detrás das costas... é o peito. E a barriga, importantíssima) estes prolegómenos y al grelo como dirían nuestros vecinos españoles. A expressão, típica em castelhano, tem que ser utilizada com muito cuidado e ponderação, não vá alguma durty mind entender que possui implicações orgânico-femininas. O que eles querem dizer é «ao assunto.»

Charles de Gaulle

Posto que, só resta reafirmar que, de sanidade mental, tenho quanto baste. O enunciado dos meses que acima se pode encontrar e que terá motivado toda esta balbúrdia, deve-se ao facto de, a propósito das recentes expulsões de portugueses ilegais no Canadá, alguns há uns largos anos, me ter ocorrido a viajem do general Charles de Gaulle ao Québec.

Ficou célebre a visita. Estava-se em Julho de 1967. Permita-se-me que transcreva aqui um apontamento entusiástico da autoria do cura Maurice Cossette. Em francês, naturalmente, pois assim tem muito mais interesse e significado. O digno sacerdote não se coibiu de deixar transparecer o que lhe ia na alma, perante as afirmações veementes do Presidente da República Francesa. Leia-se:
«Le lundi 24 juillet 1967, le Général de Gaulle emprunte le chemin du Roy de Québec à Montréal. On avait peint pour l'occasion des fleurs de lys sur l'asphalte, tout au long du parcours. Le soir, devant l'Hôtel de ville de Montréal, à 19 heures 30, De Gaulle salue la foule et prononce un discours où il évoque la libération de la France en 1944. Il conclut par ces mots: “Vive le Québec libre! Vive le Canada français! Et vive la France!”, au grand bonheur de la foule présente.»

Não será necessária a tradução? Pelo sim, pelo não, ela aqui vai: «Na segunda-feira, 24 de Julho de 1967, o General de Gaulle toma o caminho do Rei em Montreal. Para (festejar) a ocasião, tinham sido pintadas no asfalto, ao longo de todo o percurso, flores de lis. À noite, em frente da Câmara Municipal de Montreal, às 19 horas e 30, de Gaulle saúda a multidão e pronuncia um discurso em que evoca a libertação da França em 1944. Conclui com estas palavras: “Viva o Québec libré! Viva o Canadá francês! E viva a França!”, perante a enorme felicidade da massa humana ali presente.»

Isto deu, na altura, um enorme imbróglio entre Paris e Otawa. Percebe-se porquê. Na Belle Province, um visitante ilustre soltava um verdadeiro grito de Ipiranga. O Canadá explodiu. Poderia ter escrito o resto do Canadá. Mas, há que o dizer, a maior província de um país imenso, francófona de tal modo que as placas de sinalização dizem STOP – ARRÊT, que reivindicava a sua independência, rugiu de contentamento porque não se considerava... canadiana.

De acordo. Estou ao lado dos québécois. Não sei se algum dia chegarão à independência, por mais referendos que se façam. Nem sequer sei equacionar se isso lhes seria conveniente. Para o Canadá – não. Recordo-me apenas de, no Parlamento do Québec, o então primeiro-ministro René Levesque me ter dito, quando com ele conversei durante uns largos minutos, que, para ele, o General era um dos Homens mais importantes do Mundo e da História.

A folha do plátano

Para o Armando Fernandes e o Raul Palhau, os meus cunhados ali residentes, que sabem o que eu penso, não se põe, sequer, a escolha entre a folha do plátano e a flor de lis. A primeira é que vale; a outra é, tão só, um sucedâneo permitido. Um ersatz, como dizem os alemães. De independências, acentuam eles, já lhes chegou as de Angola e Moçambique onde residiam, com a «infame descolonização» à mistura.

Como atrás se escreve, tudo isto me chegou aos lóbulos cerebrais por mor das expulsões de compatriotas pelo Governo canadiano. À volta das quais se levantou um tremendo burburinho que, inclusive, levou Freitas do Amaral a conversar na capital do país com o seu homólogo canadiano.

Muito se escreveu, muito se reportou, muito se filmou, muito se televisou... O assunto é tema excelente para vender aos consumidores. O pessoal pela-se por estas enjorquices. O choradinho é fácil em casos teste jaez. Os meninos e as meninas já nascidos e crescidos no país independente, com a soberana britânico como Chefe do Estado, o que faz alguma confusão, ficam muito bem nos ecrãs. De preferência usando óculos escuros para esconderem alegadas lágrimas. É isto.

Não houve, agora, aumento significativo do que acontecia anterior e regularmente. Acontece, porem, que o novo Executivo chefiado por Stephen Harper parece apostado em utilizar a transparência que entende (e, para o autor destas linhas, bem) necessária. No que é secundado pelos seus ministros da Imigração, Monte Solberg, e dos Negócios Estrangeiros, Gordan MacKey. A única pergunta a fazer: porque não se legalizaram aqueles portugas a tempo e horas? Muitíssimos outros o fizeram. Logo, não se venha com queixumes e dificuldades de.

Está visto. Esta cena da concatenação de ideias é, ainda que frequente, difícil de explicar. O Povo fala das cerejas que vêm umas atrás das outras. O senhor Pavlov é que começou com a estória dos reflexos condicionados. Daí até ao Québec libre...

1 comentário:

Anónimo disse...

Que a folha do platano seja a que vale e que a flor (de lis) continue como un sucedaneo permitido...
Como cantava aquele cantor brasileiro de quem esqueci o nome, eu também digo " E seja assim pra toda a vida e a Deus mais nada pedirei..."
E mesmo que tenhamos opinioes diametralmente opostas nao sera por isso, estou certo, que deixarei de ser teu irmao quase angolano.
Aqele abraço
FLBandeira