quarta-feira, agosto 30, 2006

Molécula sintética provoca
«suicídio» da célula cancerosa

Antunes Ferreira
Mais um texto que as agências nos fazem chegar sobre um tema que a Humanidade persegue, pode dizer-se, desde sempre ou, pelo menos, desde que se diagnosticou essa doença maldita que é o cancro. Aparentemente os tratamentos até agora praticados resumem-se a três grandes ramos: a cirurgia, a radioterapia e a quimioterapia. Que me perdoe quem sabe do assunto esta veleidade de um leigo que se atreve a publicar o que se segue.

A notícia, pois que de notícia se trata, não de comentário, muito menos opinativo, aqui se regista, como já fiz anteriormente a propósito das células estamínicas. Repito, ainda, o que então escrevi sobre a porta que se vai entreabrindo, mas que não pode ser considerada de aplicação imediata, muito longe disso. A esperança - que se diz ser a última coisa a morrer com o Homem - não pode ser encarada como uma garantia de cura para todos os problemas cancerosos à la longue. Que isto fique bem claro: este blogue regista o acontecimento com a finalidade única de o dar a conhecer a quem o lê.

Para charlatões e charlatonices já bastam os principais intervenientes no miserável «caso Mateus». Nestas linhas não se compram nem se vendem, nem sequer se emprestam futebolistas. O mercado dos escravos parece que já passou, mas não. Estamos, agora, face a mais uma descoberta da ciência médica que tem de se entender dentro dos seus limites e, fundamentalmente, quanto ao decurso do tempo. Oxalá venham mais notícias destas. Eu cá estarei, nós todos cá estaremos para as publicar.

In fine: Um comentário de um clínico ou mais seria muito bem vindo para ajudar a compreender o que se está a passar na evolução da luta contra o caranguejo criminoso.


A equipe de pesquisas sobre o cancro da University of Illinois criou uma molécula sintética que activa a enzima responsável pelo comando de autodestruição também nas células cancerosas. Este mecanismo só funciona nas células normais. Especialistas dizem que o estudo, publicado na revista Nature Chemical Biology, oferece grandes possibilidades na busca de novas formas de tratar a doença.

Tratamentos individualizados

Uma das características marcantes das células cancerosas é a sua resistência ao mecanismo natural de autodestruição, o que permite que elas sobrevivam e formem tumores. Todas as células possuem uma proteína chamada procaspase - 3, que o organismo transforma numa enzima, a caspase - 3. A enzima promove a autodestruição da célula doente.


Mas essa transformação da proteína em enzima não acontece em células cancerosas, embora, paradoxalmente, células de alguns tipos de cancro, como o de pele, fígado e intestino, possuam altos índices da proteína procaspase - 3.

Os pesquisadores testaram mais de 20 mil substâncias sintéticas para ver se alguma delas poderia activar o processo de transformação da proteína na caspase - 3. E descobriram que uma molécula chamada PAC - 1 consegue fazer isso. Assim, células cancerosas de ratos e de tumores humanos foram mandadas «suicidar-se», um processo conhecido como apoptose. Segundo o estudo, quanto mais procaspase - 3 uma célula cancerosa possui, menos moléculas PAC - 1 são necessárias.

Células saudáveis, como os glóbulos brancos, foram significativamente menos afectadas pela adição de PAC - 1 porque tinham níveis muito menores de procaspase – 3. Assim, o «suicídio celular» não pôde ser activado. Os testes com PAC - 1 em células saudáveis e cancerosas de uma mesma pessoa revelaram que as células do tumor eram duas mil vezes mais sensíveis à molécula PAC - 1.

Os pesquisadores encontraram índices diferentes de procaspase - 3 nas amostras de células estudadas, o que os levou a concluir que alguns pacientes responderiam melhor ao tratamento do que outros. Eles acreditam, portanto, que um dia seja possível criar tratamentos individualizados para cada paciente.

O cientista Paul Hergenrother, coordenador da pesquisa, disse que a molécula PAC - 1 é o primeiro de uma série de compostos orgânicos com a habilidade de activar as enzimas que controlam a autodestruição das células. «A eficiência potencial de compostos como a PAC - 1 poderia ser prevista», acrescentou Hergenrother. «Assim, pacientes poderiam ser seleccionados para tratamentos baseados na quantidade de procaspase - 3 encontrada nas células do tumor».

Comentando o estudo, o especialista Michael Olson, da entidade patrocinadora e de fomento da pesquisa, a Cancer Research UK, disse: «Esta descoberta representa uma estratégia terapêutica nova para o tratamento de alguns tipos de cancro». Olson também referiu que, no entanto, a terapia precisa ser testada clinicamente para verificar possíveis efeitos adversos em humanos .









Garrote de coiro

Antunes Ferreira
E
stá estendido em cama de folhas podres, entre os trocos das árvores, o que lhe permite descansar um pouco, mas também o leva a pensar. O braço amputado pelo meio de cima, garrotado com cinto de cabedal nem é o mais importante. Os camaradas, por ordem dele, tinham-no deixado para trás, a fim de não atrapalhar a retirada, pois os tugas tinham reagido com muito poder de fogo, nunca vira tanto tiro ao mesmo tempo. Também tem um buracão na barriga da perna esquerda com penso grande por cima, e estilhaços por todo o corpo. Doem.

O que passa na cabeça dele, Adão Macombe, só ele sabe. Nem o tal deus que o missionário Luigi lhe tinha tentado meter na cachimónia, nem esse gajo. Só ele sabe. De resto, ele não há. O camarada Vicente Nandhula bem lhe explicou que esse gajo pregado numa cruz que dizia que era o filho de tal coisa era uma invenção dos brancos para escravizar os pretos.

Você já reparaste com certeza, que não tem patrício na Bíblia, e assim, e assim e assado. Vais no Moscovo e pode ver o camarada Lenine no seu urna de vidro que ‘té parece vivo. Onde fica o caixão do Cristo? Não tem porque ele ressuscitou, como lhe dizia o padre italiano, era a ressurreicione do Signori. Porém, o camarada comissário, que era do Ucua, parece é que tinha razão. Não tem Jesus, é tudo aldrabice.

No entanto, ali no meio da mata, está a pensar que é melhor recordar uma oração, se não toda, um bocado, para pedir no céu que as formiga marabunta não ande por ali, o cheiro do sangue as atrai e elas come tudo. Lhes viu, de longe, deixar uma palanca negra ferida no lombo por onça ou assim, só no esqueleto. Por onde passa as assassina devora carne morta, capim, casca de árvore, parede de bosta, até animal vivo. Filhas das putas.

Do coto escorre um fiozinho vermelho, nada de especial se não tem formigas por ali. Se bem que tem uns morros aos buraquinhos, será que é de salalé? Se são, está fodido. Isso é, sim, o mais importante. Um dia um homem tem de morrer, é a única coisa certa que existe, já começa a contar quando sai da coisa da mãe. Com tiro, com doença, de velho. Mas comido vivo por formiga, aiué, isso ele não quer.

Os companheiros lhe deixaram alguma comida, não muita. Umas mandiocas, um cacusso seco, três carambolas e um pacote de bolachas búlgaras. Ou serão soviéticas. Esses gajos escreve todos do mesmo maneira, letras esquisitas mesmo, tudo ao contrário, o Vicente lhe disse que para eles um P é um R e um N (de pernas para o ar) é um I e um C é um S. Estranha coisa essa dos alfabetos, cada um usa o seu, os cunhetes que vem da China têm uns gatafunhos carregados de risquinhos, cruzinhas e rabinhos que lhe disseram são também letras.

O sacristão portuga do cura Luigi, o Manteigas, era assim chamado por ser a sua terra, mas também porque era paneleiro assumido e no princípio tinha de usar um pedaço daquela gordura para facilitar os amantes – mas só no começo, galhofava, entre duas gargalhadinhas, depois é o que é, nem elefante me assusta. Pois o Manteigas também lhe ensinara que o latim tinha o mesmo abecedário do que aquele que se usava, ainda que por vezes os romanos trocassem o U pelo V.

Os filhos do padre

Estranhas coisas sabem os homens e até mesmo os maricas. Na sanzala dizia-se que o pároco dormia com a Manelinha, preta cafusa, bonita, ancas de sonho, pernas bem lançadas e mamas orgulhosamente tesas. Ele era menino – será que agora ainda o é? – e ouvia que o padreca, com os seus cinquenta e picos, já tinha um casalinho de mulatos da mulher que pouco passava dos 17. A vida é complicada. Um homem não é de pau.

A missão tinha a igreja com a sacristia, a escola e uma casa para gente. O padre vivia numa moradia com telheiro à volta. O Manteigas noutra, mais pequena, mas também com varanda corrida e coberta. Tinha, alem disso, uma enfermaria, limpa, até as camas levavam mosquiteiro. Tudo em adobe de cimento, seguro e estável, coberto a tela vermelha. Lá mais para trás estava o cemitério, com cruzes nas campas e algumas flores.

Adão gostava de ir no campo dos mortos, a que o padre Paolo, também italiano, chamava qualquer coisa como necrópole ou lá o que era. Ver as tumbas alinhadas, bem arranjadas por fora, o Justino coveiro tinha arte para bater a terra até que ela ficasse bem acamada e direitinha. Até dava gosto lhes ver, chão de pessoa crente, muito diferente do que era uso no povo da sanzala.

Espanta-se. As milhentas dores que o cravam transformaram-se numa só, lancinante, que se instilou por todo o corpo. Antes sentia o braço cortado, os estilhaços impostos na pele, o buraco na perna; agora não. Agora é uma verruma que lhe penetra cada vez mais no corpo, não sabe bem onde. E com a dor acentua-se a imagem dos túmulos da missão. Se calhar já começa a morrer, quem sabe já começou mesmo.

No dia em que se pirou da tutela missionária, e isso ele não esquece, nem pode, patrão, já tinha o cura Luigi há uns tempos a morder-lhe os calcanhares, furioso e ameaçador. Recorda. Uma noite em que o italiano fora dar a extrema-unção num outro povo mais distante, a Manelinha acenara-lhe com a mão para que ele se lhe chegasse ao pé. Só para conversar, patrício. E porque torna e porque deixa, o homem já não prestava na cama e na disposição por mor da impotência.

E ela cheia de vontade de fazer feliz alguém, leoa em cio, desejo a subir do vale selvagem e peludo à cabeça. Apertava os peitos com as mãos. Vê, mano, como eles estão duros, precisam de mimo de macho, de beijos e mordidelas. Mama não serve só para dar de beber aos minino, Adão. Eu está lhe vendo de longe, músculo, sem barriga, e o volume que você tens no sítio indicado não engana ninguém, muito menos a mim.

O começo do fim

E passou-lhe a mão suave mas possessiva entre as virilhas, e agarrou-lhe o primo de baixo que estava teso e grande como tronco de mafumeira. Não podia ser melhor. Entrados na casa, nem tempo tiveram para se despir. Foi já em cima do colchão de sumaúma que lhe rasgou saia lhe arrancou as cuequinhas, lhe pôs os seios ao léu e os começou a sugar, ávido, enquanto lhe buscava de dedo em riste os lábios molhados da gruta.

Fora só o começo. Mal o padre se descuidava, saía por isto ou por aquilo, eram cavalgadas sem esporas, eram beijos nos centímetros do corpo que começava a suar, em todinhos, era o sumo que lhe corria da coisa, era o delírio, era o deliquio. Ela insaciável, mulher duma cana, toda ela era cona. Ele sempre teso, na fúria permanente de lhe encher os buracos do corpo, de a regar de seiva pegajosa.

Tinha de dar o que deu. A Manelinha ficou prenha num ai. Nenhum deles queria fazer de outro modo para o evitar. Ela até tinha falado com a Josefa, mulher velha e sábia que mais curava a gente do que o enfermeiro Cazombe João. Parteira, espanta espíritos, sapiente de mezinhas, de ervas do mato e de raízes benfazejas, a velha lhe tinha dito que só desmancho, mas já no quarto mês não tinha seguro.

Matar o minino antes de nascer – não. Ponto assente entre os dois. Aquele inocente teria de vir ao Mundo, com Luigi ou sem. Só que a barriga começara a crescer, a empinar, e o padre começara de lhe seguir por toda a parte, a rosnar ameaças, seu sacana me puseste os cornos, mas eu fodo-te, basta que não estejam a ver e mato-te como um cão. A ti e a ela. Cornuto não fui, não sou nem nunca serei.

Só havia uma saída: a fuga. Tentou que ela viesse com ele, com as crianças mesmo, mas ela lhe disse que não, a vaca. Saíra por uma madrugada, o sol ainda não despontava, a mata cheirava a goiaba e tamarindo, lembrava a Manelinha nua lençóis no chão e ele a gatinhar por cima dela. Pensara até em voltar para trás. Se o fizesse tinha de matar o cura antes que este o fizesse nele, Adão, filho de Macombe Matias.

A saga da liberdade

Na mata ficou, com amigos que já por lá viviam, que combatiam os tugas, em ânsias de independência ou de liberdade, ou algo assim. Pelo menos era o que o camarada Vicente ensinava-lhes, o direito a serem livres e conquistarem o que os brancos nunca lhes tinham dado, muito menos dariam. Não era difícil de entender, qualquer matumbo lá chegava.

Ele que nunca fora tropa afeiçoara-se à Kalashnikov e às granadas e às minas e à bazuca e ao morteiro. De tal modo que muito depressa lhe tinham promovido no comando de grupo de combate. A vontade de ganhar dos peles claras – nunca o tinha pensado, mas fá-lo agora – era um pouco o desejo de matar o cura Luigi, mas isso eram outras contas de outro rosário, como o cabrão dizia.

Da Manelinha, nada. Do filho dele, zero. Tinha a certeza de que era um rapaz, não podia ser outra coisa, mas não tinha informação, nem recado de carregador, nem tam-tam. Mas pensava que não lhe fazia mal, que tinha de andar para a frente, lutar pelo seu País, colónia há muito ano. Quando ganhasse a guerra, logo iria na procura de mãe e filho. Tinha tempo.

Mas agora – não tem. Já não é uma dor, já não sente o corpo, já o sangue estancou. Mas a vida se foi. Aos pedacinhos, passo aqui, passo acolá, sem eira nem beira. Por isso os camaradas lhe tinha deixado tão pouco de comer e menos de beber. Ele está ali para morrer, antes mesmo que as formiga lhe roam a carne e os ossos em vida. De entre os lábios ressequidos sai um cuspo amargo.

Quem sabe, é a altura da tal oração. Nunca fiando, não vá o cabrão do italiano ter razão, com cornos ou sem cornos, bem pode que aconteça que o diabo o leve para um inferno pior do que este que tem na terra. O hálito fede-lhe. Um frio como nunca sentiu entra-lhe pela pele, abraça-o por dentro, asfixia-o. E não está frio. O sol dardeja, mas não lhe aquece.

Olha em volta. Ainda não tem marabunta. Lhe deu só vontade grande de saber se tem filho, com certeza, ou filha, nunca se sabe. Uma certeza o agarra: nunca vai saber. A névoa que lhe trama os olhos é pesada. Mesmo assim, ainda consegue ver a mancha violenta e ruidosa das formiga. Suas putas, já não me mastiga vivo. E meteu o cano da espingarda na boca.




Claudia Só Fia

Anda uma mãe a criar um filho para que lhe, me, aconteça uma coisa destas. À Claudia Sofia, a coisa deu-lhe forte, ainda que haja que dizer que - à semelhança dos vinhos dões, vindimas, mateus e viseus e outros que tais - tal como a anedota diz, amanhã passa-lhe. Se calhar a jovem jornalista até sabe da graça. Uma senhora muito, muito, muito feia vai a passar e está um bêbado sentado na beira do passeio. «Hic... Porra que gaja mais hic... feia!». E a senhora como os trovões: «E você está bêbado que nem um cacho!» E o ébrio: «Sim, mas amanhã passa-me...» A Claudia, em resposta a um imeile meu, mandou-me o que segue em baixo. Coitada da distraída.

Tenho que agradecer como posso este tsunami de elogios. Engano de alma, ledo e cego, por certo, como diria o Vate. Mesmo assim, só há um modo de o fazer: sem lhe pedir liceança, dá-lo a conhecer aqui no traves...etc.com. O que faço, com muita honra, prazer e babadinho de todo. Claudia Sofia à presidência! E os ricos que paguem a crise! Vou, de seguida, remirar-me ao espelho. Tenho a certeza de que o meu ego cresceu - em cintura. AF

A prova do crime

Queridíssimo Henrique Antunes Ferreira,

Antes de mais, peço-lhe imensas desculpas pelo meu atraso na resposta ao seu emílio, que deu cor à minha caixa de correio abarrotada de outros emílios chatos, maçudos e sem prosa que se leia!

Podia dizer que estive de férias nas Caríbas, Miami ou até mesmo Tailândia, mas a verdade é que nem a Cuba (do Alentejo) pude ir!! Infelizmente (ou felizmente - já nem sei -) o trabalho não permitiu!

Mas o meu prezado amigo estava no top da minha lista de prioridades e aqui estou eu a cumprir agenda.
Deixe-me gabá-lo mais um 'cadito ( eu adoro e o 'minino' merece!) dizendo-lhe que gosto tanto do seu blog que ando feita comerciante a divulgar o seu produto (refiro-me, obviamente, ao seu digníssimo bilogue! - mas se tiver mais produtos para comercializar faça favor de dispôr desta sua fã incondicional!) pelos 4 cantos do mundo blogosférico e não só - tenho programada uma acção de divulgação na Lua, mas a NASA ainda não me disponibilizou transporte!

Voltando às minhas derradeiras desculpas, pois cá ando eu atarefada a trabalhar no "meu" jornal - Gazeta Rural, de Viseu - (se desejar enviarei, com todo o gosto, um exemplar para o seu Real Domicílio), agora com a Feira de S. Mateus e com os Vinhos também que me deixam completamente embriagada de tanto trabalho. Pode-se até dizer que sou uma autêntica "prostituta laboral", mas o que tem de ser tem muita força, daí estes meus atrasos nas correspondências - pedindo, desde já, a devida clemência e absolvição do pecado!

Obrigada pelos queijinhos e hiscachos... comidos, bebidos e agradecidos!
Camiões de beijos para si (não seja invejosa e divida-os com a sua mais- que -tudo) desta sua amiga
Claudia Sofia


terça-feira, agosto 29, 2006

Um teste e tanto

H
oje deixo aqui um texto de um teste oriundo do Brasil e que peço a Vocências que leiam com muita atenção e respondam se quiserem. O tema da condução num País como o nosso, em que a taxa de acidentes rodoviários e de mortalidade deles decorrente é altamente preocupante, leva-me a recomendar-vos o original em baixo. Se não acertarem nem à primeira, nem à segunda, nem... - não fiquem preocupada(o)s: há gente pior; não digo onde e quem, mas há. Note-se: já mandei este excelente e sério teste por imeile a muita malta amiga. Se aqui o encntram de novo, mea culpa.

A mudança de casa dá-me cabo da cabeça, da paciência e da carteira. Mas como vamos para melhor (o que nem sempre acontece), até aguento tudo. Depois eu conto com mais pormenores. Para já, frequento menos este blogue, mas não desisto. Seguro. Daqui a dias, poucos, volto em força - e com novas forças. AF

Condução

Você está pilotando um carro e mantém velocidade constante. Ao seu lado esquerdo encontra-se um Cisne Enorme. Ao lado direito, um grande carro de bombeiro, que mantém a mesma velocidade que você. Na sua frente galopa um porco, que é bem maior do que o seu carro, e você não pode ultrapassá-lo. Atrás de você vem um helicóptero que voa rente ao chão. Tanto o porco como o helicóptero mantêm a mesma velocidade que você. O que você faz para sair desta situação em segurança?

Não sabe? Tente de novo...

Continua a não saber? Consulte o Código da Estrada e tente de novo...

Ainda não sabe? Vá tentando...

Bom, face a isto, o melhor é mesmo ver a resposta de seguida...


********************** Resposta:

Salta do carrossel ... e pára com a cachaça, que isso está te matando !!!

domingo, agosto 27, 2006





XUTO NA KANELA

Futebol ao fundo

O estranhíssimo caso Mateus é absolutamente redondo. Não tem ponta por onde se lhe pegue. Um verdadeiro cozinhado com todos. Não vale estar aqui a tecer considerandos – que aliás nem trariam qualquer acréscimo ao imbróglio que já mete gente e entidades a dar por um pau – mas, sem pretender substituir-me a quem de direito, deixar uma simples contribuição. Na falecida União Soviética, e de acordo com o Amigo que foi conhecido pelo apodo de Chico da Cuf, havia fuzilamentos «provisórios»… Não era de descartar a hipótese, um tanto improvável, de uma qualquer reabilitação.

Por cá, poder-se-ia alinhar, no mínimo, uma bela quantidade de candidatos, desde a FPF à Liga, passando pelo Conselho Jurisdicional desta e pela Comissão Disciplinar da primeira, bem como pelo Gil Vicente e, por tabela ou não, pelo Belenenses e por último (???) pelo Leixões. Nem vale a pena citar os nomes que andam na boca dos adeptos, de Fiúza a Valentim, de Cunha Leal a Madaíl. Muito menos, as ameaças do sr. Blatter, manda-chuva da FIFA.

Todos al paredón, como dirían nuestros hermanos. Provisorio, por supuesto. Se estivéssemos na batalha naval: futebol ao fundo.

Duas partes distintas

Quem diz tintas diz brancas, afirma jocosamente o Zé-Povinho. Mas a verdade é que o meu Sporting Clube de Portugal está a praticar esse jogo um tanto suicida que se pode resumir assim: na primeira parte, não jogar nada; na segunda, ganhar os jogos. Até ver. Há já quem receie que se esteja em fce de uma delicada situação de dupla personalidade.

Será que Paulo Bento tem andado a ler Robert Louis Stevenson? Será que o Estranho caso do doutor Jekyll e do senhor Hyde dorme na banquinha de cabeceira do técnico leonino? Será que o romance célebre publicado em 1886 tem agora em Alvalade uma reedição que ameaça tornar-se um susto permanente para os adeptos leoninos?

Pelo sim, pelo não, Soares Franco já terá mandado estudar a possibilidade de incluir na Gamebox uma caixa de Valium. Si non e vero…

O outro Loureiro

Já havia o major; agora existe o Hermínio, que já é conhecido pelo outro Loureiro. Quem não terá gostado da laracha é o João filho, ex-baterista dos ex-Táxis, já lá vão uns aninhos. No Bessa ter-se-á, segundo fontes seguras e bem informadas (e anónimas com assinatura e Número Fiscal do Contribuinte), ouvido o comentário do Presidente axadrezado. «Só faltava este. Já cá havia dois. Como isto anda!...»

O antigo secretário de Estado do Desporto no governo de Santana Lopes mantém-se irrepreensivelmente mudo e quedo perante o tsunami que varre o futebolzinho indígena. Um arruaceiro, conhecido de ginjeira dos homens de bem que ocupam lugares de dirigentes máximos do mundo futeboleiro, terá comentado que o outro Loureiro – com as maiores desculpas ao doutor João – cumpre fielmente o dito ou entra mosca, ou sai asneira.

O futuro chefe do Gabinete do pré-presidente terá já comentado que não é nada disso. O caso é que o meu patrão a prazo ainda nem tomou posse.
A.F.

sexta-feira, agosto 25, 2006





Uma verdadeira revolução na Medicina !!!!!!!!!!!!!!!!!

Células estaminais:
novo método de colheita


* Doentes com Cancro, Sida, Alzheimer, Parkinson, AVC poderão ter mais esperança

Antunes Ferreira
Uma esperança gigantesca surgiu na medicina. Uma verdadeira revolução. O anúncio de um novo método para recolher células estaminais fundamenta este enorme contributo para a polémica de há muito animada pelos defensores da utilização das células com a correspondente morte do embrião e pelos que em nome da ética e da moral a reprovavam e, até, a proibiam. Entro, assim, por um campo em que sou, porque naturalmente leigo, apenas, o transmissor de notícias veiculadas pelas agências e tratadas em grande parte dos nossos órgãos da Comunicação. A nova técnica vem deitar por terra os argumentos éticos dos críticos desta investigação que acusam os cientistas de destruir vidas.


De acordo com a Agência Lusa, que cita Rui Reis, presidente da Sociedade Portuguesa de Células Estaminais e Terapia Celular, o método anunciado ontem na edição electrónica da revista norte-americana Nature era procurado há vários anos por diversos especialistas. Com ele não há destruição do embrião e são obtidas células estaminais que podem ser uma resposta em terapias para doenças como a cancro, sida, diabetes, Parkinson, ou Alzheimer.

O geneticista Carolino Monteiro considerou, também em declarações à Lusa, que produzir células estaminais embrionárias sem destruir o embrião é uma «descoberta importante» porque escapa às questões éticas, dando mais um passo na direcção da terapêutica de doenças sem cura. Carolino Monteiro lembrou ainda que «os cientistas têm humanidade e trabalham para o bem». A ética, disse, «é fundamental e tem que acompanhar a evolução da ciência, mas não deve ser utilizada para fins moralistas». Porém, se agora foi descoberta uma forma de fazer investigação sem destruir o embrião, tanto melhor, porque «esta área é a única que terá as células mais adequadas para a terapêutica de doenças sem outro modo de cura, como as neurodegenerativas, o cancro ou a infecção por HIV», destacou.

Novidade extraordinária

No inquérito referido, o geneticista Mário Sousa, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, do Porto, considerou mesmo revolucionária a possibilidade de serem geradas células estaminais sem que o embrião humano seja atingido, tal como avançou uma empresa norte-americana da área da genética. «É uma revolução em medicina a confirmar-se quando se puderem repetir as experiências seguindo a metodologia que foi utilizada. É uma novidade extraordinária», explicou.

«De uma célula, conseguir proliferá-la em milhões de células estaminais, como as que são necessárias para a terapêutica de tecidos, é uma revolução médica, e é muito difícil de imaginar como conseguiram, mas o que é facto é que está aí a novidade», acrescentou. Mário Sousa disse mesmo que esta descoberta é de alguma forma semelhante ao mito de «transformar o ferro em ouro» já que assim se consegue ultrapassar o obstáculo de se remover uma ou duas células do embrião sem que elas morram passado um dia.

Por seu lado, Rui Nunes, professor de Bioética da Universidade do Porto, também concordou que caía por terra o problema ético, uma vez que os cientistas americanos disseram que conseguem criar as células estaminais sem atingir o embrião original. «Logo vem agradar a todas as partes. Acho que foi um passo muito importante quer do ponto de vista científico, quer do ponto de vista ético, social e político. Como toda a gente se recorda este foi um dos principais temas da campanha eleitoral nas últimas presidenciais norte-americanas», concluiu.


Trata-se de um outro membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida que entende igualmente que esta descoberta faz com que «mesmo aqueles que consideram que o embrião é uma vida humana» possam aceitar esta nova técnica. «Se se puder colher uma célula, e se puder preservar totalmente a sua integridade física é óbvio que deixa de existir qualquer tipo de argumentação ética que impeça a utilização e o desenvolvimento desta técnica», frisou.


Ética não é inimiga da ciência

Entretanto, à Rádio Renascença, Daniel Serrão, membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, explicou que a produção de células estaminais sem destruir o embrião é uma notícia «verdadeiramente extraordinária, confirmando que a ética não é inimiga da ciência - quando a ética levanta dificuldades estimula a ciência a resolver os problemas. Nós sempre dissemos que o embrião tem direito absoluto à vida e ao desenvolvimento».

Com este novo método agora revelado, usam-se embriões bastante mais imaturos, com apenas oito células. É colhida apenas uma, que é cultivada em laboratório. O embrião não precisa de ser destruído - pode continuar a desenvolver-se até ao termo da gravidez, se for implantado no útero de uma mulher. O feito – porque tudo indica que o seja e de dimensão incomensurável – tem por autora a equipa de Robert Lanza, da empresa Advanced Cell Technology (Massachusetts, EUA), que já tinha conseguido fazer isto com células de ratinhos, no ano passado. Agora, logrou criar duas culturas de células estaminais embrionárias humanas, usando células colhidas em 16 embriões que sobravam de tratamentos de infertilidade.

Os cientistas testaram as culturas de células criadas com este método e confirmaram que podem ser usadas tanto para fazer testes genéticos, como para produzir um vasto leque de tecidos. Esta descoberta é relevante para os Estados Unidos, onde está proibido o financiamento público de experiências que investiguem o potencial terapêutico das células estaminais, mas é-o igualmente para todo o Mundo.


No final dos anos 80, as células estaminais do cordão umbilical começaram a ser utilizadas nos casos de cancro, lesões nas cartilagens, diabetes, transplante de células estaminais pancreáticas, queimaduras, doenças cardiovasculares, enfarte de miocárdio, AVC, lesões vasculares periféricas, doenças neurodegenerativas, Parkinson, Alzheimer, lesões na espinal medula, doenças ósseas, produção de tecido ósseo a partir de sangue de cordão umbilical, leucemia e linfoma, doenças hematológicas hereditárias, doenças auto-imunes como esclerose múltipla, reposição de células hematopoiéticas após quimioterapia.

A criopreservação do sangue

A diferença entre a criopreservação do sangue do cordão umbilical e a utilização da medula óssea pode verificar-se no facto de a primeira ser indolor, enquanto a segundo é passível de ser dolorosa, já que é realizada através de uma agulha no osso ilíaco. A acessibilidade para o transplante também é mais fácil: é retirado do inventário e enviado dentro de 24 horas. O número de células disponíveis é maior do que na medula óssea. Também existe maior probabilidade de encontrar um dador compatível no caso do sangue do cordão umbilical.

Gary J. Schiller, director da clínica de estudos em leucemia da Universidade da California de Medicina, considera que «o cordão umbilical oferece uma possibilidade de esperança para doentes em fase terminal com doenças malignas que esperam um transplante. No futuro, este importante recurso pode tornar possível realizar transplantes num número alargado de doentes que não têm nenhum dador compatível. Eu acredito no processo, e por isso guardei as células estaminais do sangue do cordão umbilical do meu bebé num banco público - Cryobanks International».

Há cerca de duas décadas, a descoberta de que a placenta e o cordão umbilical continham um elevado número de células estaminais trouxe uma nova esperança ao mundo da medicina. Actualmente, a colheita e a criopreservação destas células é uma prática corrente devido à crescente consciência de que, em qualquer altura, poderão intervir em termos terapêuticos em patologias que não disponham de outra forma de tratamento.

Já são muitos os pais que optam por recolher o sangue do cordão umbilical do seu bebé e armazená-lo num banco de células estaminais. Deste modo, se algum dia a criança necessitar das células estaminais, estas estão imediatamente disponíveis para transplante (por exemplo, para reconstituição da medula óssea destruída após tratamentos de quimioterapia).


As «milagrosas» estaminais

As células estaminais possuem capacidade de se dividir indefinidamente e podem dar origem a diversos tipos de linhagens celulares, como, por exemplo, células nervosas, células cardíacas, células da pele, do sangue, do osso e da cartilagem. Permitem a ocorrência de processos de regeneração dos tecidos do nosso organismo, como a medula óssea, a retina, a córnea, a polpa gengival, a pele, o fígado, o tracto gastrointestinal e o pâncreas. Estão presentes no sangue do cordão umbilical, onde se apresentam como células estaminais adultas.

Recentemente, foi descoberto que o sangue existente no interior do cordão umbilical é uma fonte rica e facilmente acessível de células estaminais indiferenciadas. Ele é recolhido após o cordão ter sido separado do recém-nascido, e é guardado para que as células estaminais que contém possam ser utilizadas. É recolhido da veia umbilical com uma seringa ou através de uma agulha ligada a um saco de recolha de sangue, obtendo-se em média 99 ml. O sangue recolhido é processado de forma a remover os glóbulos vermelhos e o plasma em excesso, e de seguida armazenado em azoto líquido.


O processo é não invasivo e indolor e não existe qualquer risco quer para a mãe quer para o bebé. A disponibilidade é imediata, eliminando a necessidade de procura de um dador compatível. Em alguns transplantes é eliminado o risco de rejeição e da doença do transplante contra o hospedeiro. Há também uma maior compatibilidade em transplantes para familiares. Quando as células são necessárias, o cliente faz a requisição das mesmas ao banco onde estas se encontram armazenadas, que envia as células para o centro de transplante.

A diferença entre a criopreservação do sangue do cordão umbilical e a utilização da medula óssea pode verificar-se no facto de a primeira ser indolor enquanto a segunda é passível de ser dolorosa, já que é realizada através de uma agulha introduzida no osso ilíaco. A acessibilidade para o transplante também é mais fácil: é retirado do inventário e enviado dentro de 24 horas. O número de células disponíveis é maior do que na medula óssea. Também existe maior probabilidade de encontrar um dador compatível no caso do sangue do cordão umbilical.

Apenas um breve aditamento, já que o que atrás fica é mais do que suficiente para se começar a apreciar esta revolução científica. Antes de tudo, uma advertência. Não se está perante a panaceia universal que os homens tanto têm procurado alcançar. Com isto quero dizer que a porta parece ter sido entreaberta, mas há que cuidadosamente abordar o assunto, tal como é norma da ciência e, nomeadamente, da médica.

Milhões e milhões de seres humanos ao tomarem conhecimento desta extraordinária descoberta, começarão imediatamente a imaginar que as diversas doenças «incuráveis» de que são portadores, serão, de repente, curadas por ela. As expectativas, ninguém as podem tirar à Humanidade. Muito menos a esperança. No entanto, as células estaminais e a forma extraordinária de as recolher não podem ser sinónimo de taumaturgo – mas tampouco de caixa de Pandora. Calma, moderação, paciência - não são incompatíveis com a esperança.

Este é o texto mais longo que o travessadoferreira publica. Aos leitores aqui ficam as desculpas por esta dimensão. Mas, também penso que poderão concordar que a revolução médica aqui apreciada é, ao que tudo indica, uma verdadeira bomba nuclear na Medicina. Daí o volumoso. Ainda bem.

quinta-feira, agosto 24, 2006









Atenção: muito importante!!!!!!!!!!!!!!!


Um quase aniversário
e um apelo lancinante



Antunes Ferreira
Já cheira a Natal. O quê, é um exagero? Podia responder como o Paulo de Carvalho que celebrizou em afirmação cantada que a data em causa «é quando o homem quiser»; mas não o faço. Porquê? Porque, para mim, os odores a filhós, rabanadas, lareira e bolo-rei começam a efluviar logo a 26 de Dezembro com destino ao ano seguinte. É assim uma espécie de luzes automáticas: ligam-se e pestanejam sem que ninguém carregue no botão.


Em Dezembro este blogue completa um aninho de existência, pois foi parido no mesmo mês do ano de 2005. Faço aqui uma parentética, para vos recomendar que festejem o evento, mandem prendas e apaguem a vela solitária imeilicamente. Que isto não está para grandes folestrias pois a ma$$a anda muito por baixo e as ofertas próprias da quadra levam qualquer sujeito à falência.

Fecho o parêntese. E proponho-me adiantar ao que venho. Que, de resto, é coisa simples: a aceitação do travessadoferreira por parte de leitores/colaboradores que têm enriquecido – e de que maneira – este local de convívio e troca de ideias e opiniões, sem qualquer censura ou quejandos. Deixem-me que vos diga: a Liberdade é a maior componente da Democracia, ou seja, esta insere-se na primeira como uma luva em mão.

Uns temas mais do que outros vêm sendo acompanhados pela maltosa bloguista e não só com pertinácia, brilho, paciência para me aturar e determinação, mas sobretudo, com Amizade e Carinho. Dos que concordam e gostam do conteúdo e dos que, discordando, o dizem nos comentários que aqui postam.

Mas tenho também de o escrever: não me dão um especial prazer os insultos e os palavrões que também acontecem, Aida que raros, felizmente. A Liberdade é isso igualmente. Perdoai-lhes, que não sabem o que fazem, plagiando o discurso do alto - do Cristo. Do alto da cruz, obviamente.


Antecipo assim o evento, aliás invento. E volto a chatear-vos com os pedidos habituais que já se tornaram calinos. É um apelo verdadeiramente lancinante. Continuem as visitas (grátis), persistam nos comments e divulguem o blogue bem como os meus contactos imeilicos, dos quais o mais utilizado é o ferreihenrique@gmail.com. E, sil us plau (sff em puro vernáculo catalá) não me chamem melga. Mulţumesc frŏmos, que é como quem diz muito obrigado em Romeno. E esta, hein?

Quantos mais visitantes e colaboradores tiver, mais feliz me sentirei. Gosto muitíssimo de escrever (os outros é que me aturam...), mas ainda muitérrimo de conviver. E quando se ultrapassam as fronteiras portugas, como é o caso, sem falsas modéstias tenho de me considerar um gajo consorte, com sorte. Colaborem, queridas Amigos e queridos Amigas, ou vice-versa. Fico à espera – sentado. Deitado só de quando em vez.

terça-feira, agosto 22, 2006


Uma no cravo


Antunes Ferreira
De novo, o senhor dr. Jardim. Cada vez mais complicado. O incontrolável líder madeirense não está quieto, é um desassossego permanente, que até me faz lembrar cenas do Parlamento da I República, período que me interessa sobremodo e sobre o qual me debruço há vários anos. Um exemplo. Corria 1912 e as coisas em Portugal andavam mal, ou melhor, de mal a pior. A República titubeava e Paiva Couceiro era uma constante ameaça ao novo regime.

O deputado Brito Camacho, que depois viria a ocupar diversas pastas nos Governos que se foram sucedendo, pediu no Hemiciclo de São Bento que os insurrectos fossem julgados por tribunais militares, que o Poder decretasse o estado de excepção e, até, a dissolução parlamentar a que chamava o «adiamento» da Assembleia. O que viria a ser derrotado por 90 votos contra 60.




O maior opositor de Brito Camacho era Simas Machado, igualmente parlamentar de relevo e militar. Ele já se notabilizara pela forma como fizera abortar as diversas tentativas dos monárquicos para restabelecer o regime anterior. Seria um dos comandantes do Corpo Expedicionário Português na Grande Guerra e já general haveria de ser demitido do comando do Exército por motivo dos seus ideais republicanos.

Os debates entre eles ficaram nos anais do parlamentarismo português. No calor dos mesmos, ambos fizeram afirmações cada qual mais acirrada para o contricante. O coronel Simas Machado, homem cuja bravura e hombridade eram reconhecidas, perdia porem, face à ironia de Brito Camacho, ele sim um verdadeiro iconoclasta truculento.

A estória é simples. Já cansado de seguir as voltas e reviravoltas de Camacho, especialista em rabear os oponentes, Machado – de acordo com as actas parlamentares – virou-se para o Presidente da Câmara dos Deputados (que conjuntamente com o Senado constituíam o Parlamento) e disse. Estou farto das diatribes do senhor Camacho. Ele dá constantemente uma no cravo, outra na ferradura.


Brito Camacho, com um sorriso contundente: Porque Vossa Excelência não há maneira de estar quieto com o pé. Bons tempos esses em que os tribunos tiravam verdadeiro prazer das diatribes. Em que as bengaladas no Chiado eram quase tão importantes como as habilidades oratórias dos políticos. Hoje, perdeu-se quase tudo. Mas, para certos gabirus da politiquice, não seria mal pensado voltar ao uso da bengala.

PS faz guerras à Madeira

Socorro-me das agências noticiosas, par que não me acusem de invencionice. O inefável dr. Alberto João Jardim apelou sábado ao Presidente da República, para que este impeça que o Estado seja utilizado para «fazer guerras partidárias à Madeira». No seu estilo inimitável, o líder do PSD – Madeira ainda, continuando a dirigir-se ao Chefe do Estrado, solicitou-lhe: «Não consinta que alguém, no caso, do PS, se sirva do Estado, se sirva do poder que recebeu nas eleições, se sirva do dinheiro dos contribuintes, para fazer guerras partidárias à Madeira». Assim falou Zaratrusta, digo, o dr. Jardim, no comício-festa do PSD-M na ilha do Porto Santo, numa referência ao Governo de José Sócrates.





O presidente do PSD-M fez este apelo quando vincou que não aceitará qualquer alteração à actual Lei das Finanças Regionais, em preparação pelo Governo da República, no âmbito da qual o executivo de Lisboa pretende, já em 2007, e segundo o Governo Regional, cortar 128,18 milhões de euros nas transferências do Estado para a Região.

Na ocasião, João Jardim defendeu ainda que a próxima revisão constitucional de 2009 deverá consagrar um país e três sistemas (Continente, Madeira e Açores) e que apenas as matérias que fazem a unidade nacional - Forças Armadas, Segurança, Tribunais de Recurso e Política Externa - devem ser comuns às três partes. Não é novidade nem blasfémia, pois o discurso jardínico vem tendo esta componente há bastante tempo. «O resto, deixem cada parcela de Portugal desenvolver, porque esse é o caminho da descentralização», defendeu.

Sócrates quer Madeira/colónia

Segundo o também presidente do Governo Regional da Madeira, «esta ofensiva do PS, em Lisboa» «visa» inviabilizar o funcionamento da autonomia política, «reduzindo a Madeira» à situação de distrito, «para ser outra vez colónia». «Querem ou não querem a Madeira no seio da unidade nacional?», questionou Jardim, reforçando o apelo a uma resposta dos governantes da República: «digam se nos querem na Pátria portuguesa, digam se nos querem ajudar no nosso desenvolvimento».

Apesar da tónica inconsequente da sua intervenção, o líder do PSD-Madeira assegurou que os madeirenses «têm orgulho em serem portugueses», sendo a sua luta contra os interesses políticos e económicos de Lisboa, que «abusam dos portugueses do resto do País». Contradição? Auto-divergência de opiniões? Lapso? Nenhuma das hipóteses terá acontecido pois o senhor do Funchal nunca faz algo assim. Ele é a verdade.

Mas, para alem disso, garantiu que não haverá aumento de impostos na região autónoma, como medida para enfrentar as dificuldades de eventuais cortes das transferências do Estado. Já num anúncio publicado a semana passada na imprensa local, o Governo da Madeira denunciou que o Executivo de Sócrates se prepara para cortar verbas orçamentais à região, ao abrigo da revisão da Lei das Finanças Regionais, podendo os cortes atingir 128 milhões de euros no próximo ano e 187 milhões em 2010.

Numa comunicação intitulada «Informação ao povo madeirense», o Governo Regional alertava que, «caso essa proposta prevaleça», o Executivo madeirense ver-se-ia «na obrigação de tomar medidas drásticas». Na ilha do Porto Santo, onde se encontra de férias, Alberto João Jardim assegurou então que a sua equipa não procederá ao aumento de impostos para minimizar os efeitos da eventual quebra nas transferências orçamentais do Estado: «Se isto for por diante, vamos ter de espalhar no tempo os investimentos do Governo», asseverou. Jardim disse que «terá de haver outra engenharia financeira e lançar os investimentos de 2006 para 2007, os desse ano para 2008 e assim sucessivamente», e acrescentou que «os socialistas defendiam que devia lançar e aumentar impostos».



«Não me estraguem as férias»

Aparentemente já noutro registo, o dr. Jardim referiu ainda que Porto Santo «é o melhor lugar do Mundo para fazer férias, devido ao equilíbrio que se encontra». As férias na ilha permitem «urdir estratégias para melhorar a região autónoma, porque melhorar a Madeira é um contraponto ao descalabro em que o PS está a meter Portugal», e «uma inspiração para uma luta anti-socialista, porque não quero que o meu país seja um país onde há uma confusão entre Estado e PS». Instado a comentar se aconselhava José Sócrates a passar férias na ilha do Porto Santo, retorquiu: «Não me estraguem as férias».

Temos, assim, mais uma ameaça camuflada de sedição, pela boca do chefe madeirense. No seu melhor estilo, ou não estivesse de férias no Porto Santo para urdir estratégias e se inspirar para a luta anti-socialista. A excomunhão do Governo do País está feita. Jardim, o único dono da verdade, disse, está dito. Idi Amim não diria melhor. Nem Ceausescu, muito menos Kim Jong Il, para já não falar do pai Kim Il Sung.

Cavaco Silva, para quem o boss da Madeira apela, é, curiosamente, o mesmo «senhor Silva» que apostrofou tempos atrás e de quem disse que devia «ser expulso» do PSD. As habituais piruetas do Rei Momo do Funchal que não consegue estar com o pé quieto, pois este pula-lhe continuamente para a dança. Daí o dar-se a si próprio uma no cravo outra na ferradura. Quosque tandem, Alberto, abutere patientia nostra? Cícero não disse exactamente assim, mas para o caso - tem plena oportunidade.

PS - Amigões Jorge Vilas, Herculano Costa et aliud: perdoem-me, mas não consigo fugir à tentação. Se calhar também sou um troglodita, quem sabe?

segunda-feira, agosto 21, 2006



Legendas em crise



De quando em vez a vida prega-nos partidas de todo inesperadas. Ainda há quem diga que a espera convicta e militante é própria dos santos que se põem no altar. Santos por santos, nem sei quem prefira. E como não vou muito em tretas dessas, foi o joliva Santos que, desta feita, me deixou de cara à banda. E estive eu à espera que ele voltasse de umas férias de quase quatro meses, para ter tal desilusão. E eu não faço parte do grupo dos alegados santos, daqueles que as más línguas dizem que estão celestialmente sentados à direita do pai de todos. Leia-se, de todos os santos, ou seja um verdadeiro pai putativo.


Todos os santos


Pois bem, vou explicar o porquê deste escrito. Tenho tentado em vão botar umas legendas por baixo das fotos que publico neste blogue. Os resultados, não sendo completamente desanimadores, são apenas justificativos de me considerar um falhado em legendas. Creio que noutras coisas mais, mas desta feito o que vem ao caso são os piés de foto como dicen nuestros vecinos y hermanos.

O Santos, joliva, que não deve confundir-se com o Fernando Teixeira dos Santos, meu bom Amigo, apesar de ser o Ministro das Finanças (e, nessa qualidade, me e nos vai à bolsa e aos bolsos de uma forma que não é brinquedo), pois dizia eu, o joliva, confrontado com consulta que lhe fiz, disse-me que para uma legenda ao centro ainda sabia; quanto às restantes, à esquerda ou à direita, népia.

Face a tal declaração de impotência – no que concerne às legendas descentradas verdadeiramente em crise – decidi tentar uma experiência. Sempre em busca da verdade, da inovação e da modernização. Podia ter-me embrenhado no Plano Tecnológico. Mas lá dizia o Vate zarolho, mais vale experimentá-lo que julgá-lo, mas julgue-o quem não pode experimentá-lo. AF

quinta-feira, agosto 17, 2006

Nem tiro nem mina

Antunes Ferreira
Cabo-verdiano, 43 anos de idade, casado, quatro filhos, Maximiliano Pires é o Administrador de Concelho de Buco-Zau, em Cabinda, terra de fiotes e de grandes florestas.


Precisamente aqui, no Maiombe, paraíso de madeireiros. Tem casa onde vive com a família, a mulher, Laurinda é de Trás-os-Montes e professora primária, os miúdos quase tão claros como a mãe, excepção feita à Manuela, a caçula, morena linda de morrer nos seus oito anos.

Agora com o petróleo, Cabinda é rica. Quer dizer, quem enriquece é principalmente a Cabinda Gulf Oil, que explora o ouro negro e quem nela trabalha. No entanto, Portugal também não se considera muito infeliz, pois parece que há massas para todos. Dizem os cabindas que menos para eles. E se calhar têm razão. Mas isto é outra conversamole para encher pneu, como diz o Faustino, caipira do Amazonas que ali se implantou há uns anos, muito antes da FLEC.

Maximiliano, Max, para os amigos - nome assim só em Cabo Verde ou em Goa – tem um primo, Gracindo, que se dedica ao café. Diz ele que sem grandes resultados, as culturas já deram o que tinham a dar, com um tal tamanho ensarilhado de árvores, pouco espaço há para a rubiácea. Também teve cacau, até veio um gajo de São Tomé cuidar da plantação, mas foi chão que deu não uvas mas cacaueiros. Coisas.


Um dia, em Luanda, ele e o primo tinham ido a casa de um compadre para beber uns grogues de nos’terra. O Leontino morava no décimo andar do prédio da Cuca, tiveram que tomar o elevador, apertadinhos. O ascensor estava recheado de pretos, qual deles mais castanho escuro do que os outros. A algaraviada, acompanhada de grandes risadas ajudava a encher o bicho.

Quando saíram no décimo e antes mesmo de tocar à porta, sai-se o Gracindo, ó pá, aqueles gajos bem podiam tomar banho de vez em quando. Era só catinga e da mal cheirosa. O primo tinha razão. E não era apenas o cheiro a suor ácido, por ali devia andar também mija no canto do aparelhómetro e sabe-se lá mais o quê.

Gisela abriu-lhes a porta com um sorriso esmaltado na face mestiça. Entrem, entrem, O Leo está na preparação e alem das bóbidas vocês ficam para jantar ou, mesmo cear. Que não, que tinham de voltar à pensão Rosa de Porcelana, arranjar as malas, no dia seguinte o avião da DTA era logo às oito horas, tinham de levantar-se às cinco, tomar banho e restantes arranjos e talvez matabichar, que no ar não davam.


E a cachupa muito rica?

Então não querem lá ver, a comadre não arredava pé, tenho uma cachupa rica que me levou toda a manhã, quase nem ia a Quinaxixe, para comprar mandioca e peixe fresco, agora têm lá uns filetes de tubarão que dizem ser uma delícia, é serviço do Instituto das Pescas, ali à Marginal. Mas tinha ido e também trouxera uma mão cheia de camarão grosso, que já estava cozido em água com sal e jindungo.

E por banho, vocês subiram no elevador, creio. Menina, nem pareces tu. Então havíamos de amarinhar dez andares à pana. Nem que fôramos alpinistas. Pois, deita-te de bocas, e o cheirinho a malta sem banho, muito menos desodorizante... Deste na muche, Gisela, deste no centro do alvo, és melhor do que o Guilherme Tell. Essa pretalhada bem podia ao menos duchar-se uma vez por semana. Mais não que pode gastar a pele.

O Leontino ainda vinha a cheirar a cachaça da rija, quase se podia adivinhar a qualidade da cana. Bóis, vamos à nossa farra, nós cá tem de tomar banho e lavar as mãos, é tudo limpeza. Sempre lhe causava admiração o cá que significava não. Mistérios. E entrou pelo palrar das ilhas, crioulo lhe chamam, no Senegal é créole, quem havia de dizer. Claro que ficavam e dormiam e ele levava-os ao aeroporto ainda que a ressaca fosse muita. Não resiste, porém, a um bom muzungué.

Esbodegaram-se pelos cadeirões de verga que estavam na varanda, três uísques à maneira com soda e muito gelo, antes do grogue e da cachupa, acentue-se, rica. Então como vão as coisas por lá? Muita guerra, muitos tiros, muitas minas? Ele preferia falar nas mulheres, as cabindas eram as mais bonitas, mais boazonas, as melhores na cama de todas as negras angolanas.

Guerras – o trivial

Quanto a guerras era o trivial. Por lá, o MPLA não tinha, se calhar ainda, grande força. O compadre, alapado em Luanda, primeiro oficial dos Correios, matava-se pelas estórias que qualificava de bélicas. Sabia de tropa mais do que os tropas profissionais ou milicianos, até os calibres das munições lhe eram familiares.

Pois então, ele, Max, também andava metido naquela saralho do carilho, não é? Sim ou sopas? Andava. Nem era preciso acrescentar que o fazia muito contrafeito e cheio de cagaço das balas, das bombas e do resto. Porra, que quando elas assobiam à nossa volta é melhor usar cuecas castanhas para disfarçar. Mas o alferes que estava em Buço-Zau era um bacano, destemido e galhofeiro. Dispensara-se de acrescentar e solteiro, o que lhe dava mais largueza e mais miúdas.

Se falasse na família era um arraial, medo pelos filhos que não estavam criados, longe disso, medo pela mulher, que faria a Madalena sozinha se ele se finasse com um balázio explosivo na tola? Foi, por isso, avançando nas emboscadas, nos golpes de mão, nas armadilhas, na mata ciclópica, nas Panhares que não conseguiam entrar naquele labirinto de verde e picos.

... na Guiné com o PAIGC


Queres dizer, Max, pelas tuas bandas não há grande perigo? Olha se fosse na Guiné, o PAIGC já controla mais de metade do território, o Amílcar nosso patrício sabe da poda, não fosse ele engenheiro agrónomo. Claro, claro, por lá não se apagavam muitos. E muito menos um administrador de concelho. As gargalhadas tonitruantes deviam ouvir-se no Vilela.



Ainda a noite era uma criança e já estão eles no Dakota, já aterram, já desanda o Lande Rover da Administração para o Buco-Zau. Viagem tranquila, sobressaltos só na cabeça dele, o primo ressona que nem um hipópotamo – será que os hipopótamos ressonam? – a estrada nem é muito má e ele conhece-lhe os buracos todos.

É uma festa à chegada. De recordações, traz umas camisas de Macau para os rapazes, um fogareiro eléctrico para a Laurinda e uma boneca gigante e loira para a Leninha. Do Quintas & Irmão, loja de tudo, com tudo e para tudo e todos. E cadernos e lápis para os catraios da escola, que também merecem, não dão infernizam a cabeça da professora.

Ainda que manhã, leva-a para os lençóis já esticados, é sempre assim, os vales e as montanhas do corpo dela, a pele acetinada, o cheiro a floresta virgem, o que ela não é..., bem pelo contrário, adora ser comida por ele a qualquer hora e em qualquer sítio até na cozinha, esturra o saca-folha, mas que se lixe. Mãe de quatro filhos, mas rija e tesa, uma perdição.

O santo sacrifício da cama




Quando param entre suspiros e arquejos, ela avisa-o que tinham chegado os papéis das análises e que já os fora entregar ao doutor Fonseca que, mal lhes deitara os olhos dissera que queria falar com ele, quando chegasse, não era uma pressa nem morte de homem, estivesse descansada, mas queria mesmo. Depois se vê. Agora voltam ao santo sacrifício da cama, ela grita morrendo de prazer, ele ri-se, se cá estivessem os catraios, ainda bem que já foram para a escola.

Pela tardinha, doutor médico. Senta-te Max, temos que falar. Fonseca estás com um ar de cona malfodida que nem parece teu. Não há nada de grave, pois não? O galeno desvia os olhos, calado. Enclavinhadas as mãos no tampo da secretária do consultório, pergunta meio rouco, não há nada de grave, nada? Fonseca tira-me de cuidados, pareces um mudo encalacrado.

. Tem um cancro no pâncreas, mau sítio, não pode operar-se, uma ganda merda. O esculápio contorna a secretária, passa entre ela e a marquesa branca, joga-lhe um braço por cima dos ombros. É complicado, pá, é complicado. Mas tenho de to dizer assim, somos os dois homens de barba na cara, não adianta estar a mentir-te.

Nas comissuras dos lábios avoluma-se a espuma seca que lhe sobe da garganta. Isto é para quantos anos, Fonseca? Sei lá, ninguém sabe, a filha da puta desta doença é criminosa, e quando ataca no local em que se entranhou é uma gaita. Meses, Fonseca? Sei lá, repete o clínico, sabe-se lá, nem nos Estados Unidos se sabe. O caralho.

Saem os dois, o médico continua com o braço por cima dos ombros dele, vamos tomar uma bebida ao bar do Cinfães? Vão, não uma, mas muitas. Caiu a noite. Laurinda quando o vê naqueles preparos, homem de deus tu não costumas embebedar-te, que foi que te deu hoje? Conta lá enquanto te ajudo a tirar as botas e despir as calças. Conta lá. Foi alguma coisa da conversa com o Fonseca?

Não, Laurinda, não, não é nada, meti-me nos copos, cucas, nocais e uísque, até uns bagaços, uma mistura explosiva, não sei que me deu, tenho a língua enrolada, engasgo-me, mas não é nada. Vá, dorme, amanhã sabe-te a boca a papel de música mas passa-te. Eu velo por ti. Sempre.

De manhã, debaixo do chuveiro, sabes Laurindinha, não há tiro nem mina que me mate. Sossega. Garantiu-me o Fonseca.

quarta-feira, agosto 16, 2006





Desemprego ao mar


O jornalista Nuno Carregueiro (nc@mediafin.pt) do Jornal de Negócios é o autor do texto que aqui registo hoje, data em que o JdeN o publicou. Faço-o por me parecer de interesse e vir na sequência do que tenho escrito neste blogue. Naturalmente, depois de ter falado com o autor e dele ter obtido a necessária autorização para esta publicação. Fico, entretanto, muito satisfeito: um diário - que vem ganhando o seu próprio espaço nas publicações de índole económica, sob a direcção do Sérgio Figueiredo, meu Amigo de longa data, ainda que com alguns «arrufos» ocasionais - que insere um comentário destes merece ver aumentar o número dos seus leitores e a carteira publicitária. Obrigado Nuno Carregueiro.
AF

Nova descida do desemprego pelo quinto mês consecutivo

O número de inscritos nos centros de emprego em Portugal desceu pelo quinto mês consecutivo, totalizando 436.901 pessoas. O número de desempregados desceu 5,1% em termos homólogos e 1,3% face ao mês anterior.Segundo os dados hoje divulgados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), no fim do mês de Julho de 2006, estavam inscritos nos Centros de Emprego do Continente e Regiões Autónomas, 436 901 desempregados que procuravam emprego.Em relação ao mesmo mês do ano anterior, o volume de desemprego diminuiu 5,1%, fruto de um decréscimo de 23.511 desempregados registados, enquanto em termos mensais, o número de desempregados decresceu 1,3%, o que corresponde a menos 5.598 inscritos.


Este é mais um sinal de recuperação da economia portuguesa ao longo deste ano, em linha com outros indicadores económicos que têm sido divulgados ultimamente. (O sublinhado é meu – AF)

Ao longo do mês inscreveram-se nos Centros de Emprego do País, 43 654 trabalhadores desempregados, mais 2,0% do que no mês homólogo de 2005 e mais 4,6% do que em Junho de 2006.De acordo com o IEFP, a redução anual do desemprego, embora comum nos dois géneros, atingiu mais fortemente os homens (-7,5% do que no mesmo mês do ano anterior). Em todos os grupos etários se verificou uma redução de desemprego, sendo esta mais notória entre os mais jovens. Os desempregados com menos de 25 anos baixaram 12,3%.

A procura de novo emprego que justificou a inscrição da grande maioria dos desempregados (93,2%), registou um decréscimo de 5,7% relativamente ao mês homólogo de 2005, enquanto a procura de primeiro emprego evoluiu menos favoravelmente.Com excepção dos que possuíam um grau superior de ensino (+13,8%), todos os níveis de habilitação escolar registavam menos desempregados do que há um ano atrás, nomeadamente o 2º ciclo do ensino básico, com a diminuição mais acentuada (-9,3%).

Por regiões e com excepção da Região Autónoma da Madeira, onde o desemprego cresceu 6,3%, relativamente ao mesmo período do ano anterior, a diminuição do mesmo verificou-se em todas as regiões do País, com destaque para a região Alentejo, com o decréscimo homólogo (-13,5%) mais acentuado.

Quanto às profissões dos desempregados inscritos nos Centros de Emprego, os dados do Continente, confirmam, uma vez mais a elevada representatividade dos "trabalhadores não qualificados dos serviços e comércio" (53 529), dos "empregados de escritório" (50 320), do "pessoal dos serviços de protecção e segurança" (44 376) e dos "trabalhadores não qualificados das minas, construção civil e indústrias transformadoras" (38 792). Estes quatro grupos de profissões expressavam, no seu conjunto, 43,9% do total de desempregados inscritos.

Considerando a actividade económica de origem do desemprego, dos 397 289 desempregados que no final do mês se encontravam inscritos como candidatos a novo emprego, nos Centros de Emprego do Continente, 56,2% eram oriundos de actividades do sector dos "serviços", onde predominavam o "comércio por grosso e a retalho" e as "actividades imobiliárias informáticas investigação e serviços prestados ás empresas", 40,1% provinham do sector da "indústria" com destaque para a "construção" e 3,6% do sector "agrícola".
(Nuno Carregueiro, in Jornal de Negócios, 2006-08-16)

terça-feira, agosto 15, 2006





Ir na tropa

Antunes Ferreira
Encarrapitado no cocuruto do camião, sobre o oleado, um caixote de batatas e cunhetes de munições marcam-lhe as costas, Vicente Candumba, abanado como se possuído de delirium tremens, vai olhando a picada e a mata que a engole. Os buracos originam essa dança de 14 toneladas, qual elefante na pista de circo. Os bandido se calhar põe minas na terra, disfarçadas que nem se vêem, alisada por cima com as mãos e varrida com folha de palmeira para não se desconfiar da cilada. Esses gajo são mesmo sabidos, a fazer confusão ninguém lhes ganha.

As copas das árvores deixam ver uma nesga de céu. Carregado de nuvens. Vai chover, o que não lhe faz mal, meto debaixo do oleado, é melhor que capa ou chapéu-de-chuva. O pior é a lama no caminho. A camioneta enterra, há que empurrá-la, meter os tapetes da cabina por baixo das rodas para segura-la. Ele está já à pega. E paus grandes para a empurrar fora do lodo vermelho escuro. Não tem maka. Quando o chatice vem, a gente vai se arranjar, tomara que não vem ataque.

Agarrado ao volante, o patrão Fernando deve pensar o mesmo quanto às minas. Da chuva, nada. Não vê o pedacinho de céu desenhado entre as folhas. Por isso não pode pensar no atoleiro que vem aí, nos soldado a montar guarda, do furriel Montez a picar com a faca na bosta enlameada, talvez pacaça, quem sabe se palanca, para ver se tem bomba. O chefe é bom branco, lhe dá coisas boas pra comer, ovo cozido, bife, não precisa fazer funji nem gastar do peixe seco.

A mata é bonita, mas dá medo. Tudo calado, não se ouve um pio de pássaro, nem o ronco de um burro de mato, nem mesmo as folha a mexer pelas cobra que passa. Ela não faz barulho, só assobio sem som, sssssssss. Vicente tem medo das venenosas e das grandes que engolem um boi inteiro. Patrão Fernando lhes chama boas. Não pode. Uma bicha má que até assusta, que enrola o rabo no embondeiro para fazer força a fim de partir os ossos das vítima, não é boa. Aqui está enganado. O que é raro. Mas ele também diz que outros lhe chamam piton.


Chicote é chicote

Vicente tem dezasseis anos e quer entrar na tropa e jurar bandeira. É muito novo, mas vai pedir no nosso capitão Mota para lhe deixar. O nosso capitão Mota é um gajo purrêro, o amigo do Candumba, até é da mesma sanzala, a seguir à Cela, é impedido dele. É o Adão Chicote, assim lhe puseram no baptismo, por causa de um tio que morreu de tanto levar com chicote de pele de hipopótamo.

No muceque, o Chicote, que é desarranchado, conta que o meu capitão dá muita coisa na gente. Até casa no anexo e não paga nada. Ele é do QP, mas até não parece, parece mais miliciano, mas é do Quadro Permanente, como ele diz. No Puto é de Chaves, mas aqui é de Moçâmedes, até conhece a Riquita Bauleth que é miss Angola e miss Portugal. Menina muito bonita, aka. O nosso capitão veio para cá com quatro meses de idade. O pai era da Administração e foi colocado na cidade do Namibe. A mãe, que não se dera com os ares quentes do deserto, morreu quando ele tinha cinco aninhos.

Quem lhe criou foi a Intelvina, lavadeira promovida a ama. O pai, Aniceto Mota nunca mais se casou, usava gravata preta mesmo no pino do calor, era da saudade dizia. Intelvina dedicou-se ao menino Viriato, nome de rei do antigamente, dizem que lusitano. Quando ele abalou para Lisboa a fim de entrar na Escola do Exército, a ama até teve um fanico, pior do que se fosse mãe, ele não volta, nunca mais lhe vejo.

Voltou. Casado, com uma menina e um menino, gémeos, a esposa é professora do liceu, é a doutora Cândida, de tão bom feitio como o marido. Chamam-lhe a capitoa boa. E linda, como os miúdos, loira ele, loiros eles. Adiante que se faz tarde. O Adão disse nele, Vicente, que o nosso capitão lhe vai meter na tropa para você chegares a sargento-ajudante. E como deseja ele que aconteça vestir a farda. E vai querer ser capitão, nosso capitão, tem capitão preto, ele já viu, se chama Agostinho João e é de Sá da Bandeira, é cuanhama.

O nada do silêncio

A coluna pára. Ouve-se o nada do silêncio. O pisteiro diz que tem armadilha na frente do primeiro camião, uma Berliet da tropa, equipada com rebenta minas. O pessoal estende-se ao longo das viaturas, canhota em punho, não vá o diabo tecê-las. O filho da puta do mafarrico deve ter feitiço com os bandido, aparece no meio deles, com os cornos retorcidos e a deitar fogo pelas ventas. Como um homem que ele viu num circo montado ali aos Combatentes, antes de chegar no bairro das meninas.

Ninguém fala, alguns reza para dentro, quem sabe. Um fogacho no cu da coluna. Dos nossos ou dos deles. Vicente quer mesmo que seja dos bons, dos nossos. Se os gajos chegam na picada é o fim. Tropa maçarica pode ser apanhada à unha. Estes só estão cá há dois meses e picos, sempre em Luanda, nunca se viram nessa confusão. O nosso alferes, oficial do recrutamento da Província, assim se diz, leva os dedos aos lábios mudos.

Sacanas de merda volta no vosso terra, vai no cu do Salazar, vão morrer aqui todos, nós lhe damos cabo do canastro, brancos galinha, paneleiros, puta que os pariu, vão embora colonizadores, deixa a gente ser independente. Nós vai ganhar e matar vocês, maricas, borrados, cagões. A fuzilaria estala. Os soldados não sabem bem o que devem fazer, a instrução foi rápida, disparam à toa, mas atiram muito.

Ajudante Vicente já desce do camião, dá a volta a rastejar até chegar na cabina. Tem muito sangue a escorrer da porta meio aberta do Toyota. Que porra é esta? Que foi que aconteceu? Espreita. Patrão Fernando já foi. Tem a cabeça desfeita, donde jorra o líquido viscoso e vermelho que saiu com a vida. Pouca sorte do caralho, diz Candumba entre dentes, apesar do tiroteio ainda podem lhe ouvir e não volta em Luanda.

Levantou, morreu

Dois tropa passa a correr. Vicente segue-os com o olhar. Vão ajudar um outro que berra que se farta, estendido no chão barrento, uma perna dobrada, como a da caça atingida. Um deles se levanta de mais e fica logo ali, de borco, sem soltar um ai sequer. O outro gatinha até ao ferido, lhe assegura que está tudo bem, sob controlo e que os turras estão a levar na bilha que é um regalo. Dá-me água. Molhas só os lábios, o nosso alferes é assim que manda.

Uma catarata cai logo do céu, chega a água às golfadas, tamanhas como as do sangue do patrão Fernando. Um homem do morteiro entra na dança e outro atira uma bazucada para o meio da vegetação. Aiué. Os merdas retiram, grita alguém. Chumbo neles, berra outro. Uma breda montada num Unimog debita rajadas persistentes, mortíferas. Mais ruídos de quem levou na pele, salva, salva, aiué. Foderam-se os pretos de merda.

O pessoal vai levantando-se, os camuflados carregados de lama, que entra pelos poros e pelos pontos do tecido. Parece que isto acabou. Como estamos? Há baixas? Há. O Fernando camionista precisa de ser substituído e vai ser enrolado numa manta e posto no meio da barafunda da caixa do camião. Vem um condutor tropa tomar o volante, nem se limpa o sangue, agora é andar para a frente, coluna parada não interessa a ninguém, a não ser ao inimigo.

Também tem um soldado morto, aquele que se levantou quando não devia. Mais três feridos, nenhum de gravidade, nem vão ser evacuados, chegando ao Negage tem médicos e enfermaria. Vicente percebe que, depois disto, vai mesmo entrar na tropa, gostou dessa guerra, pena os que morreram, pena grande do patrão Francisco. O soldado motorista pergunta-lhe quem ele é. Vicente Candumba lhe responde que é ajudante de camionista, vinha com o patrão Fernando, se pode agora ir com ele. O condutor sorri e diz-lhe que sim, pois claro, é da casa.




O primo macaco?

V
á, sobe que esta merda já está no andor. Ainda são uma porrada de quilómetros até chegarmos, toma cuidado, resguarda-te da chuva que cada vez chove mais. Tomo, eu sei como fazer, o oleado, não preciso mais nada, só quero ser tropa. Ó catraio, mas tu ainda és um puto. Deixa passar o tempo que isso passa-te. Não passa não. Eu vai ser soldado, voluntário para entrar mais cedo. Cada qual come do que gosta e onde gosta.

Trepa pelos taipais que nem macaco sem precisar de liana. Será mesmo que os macacos são nossos primo? Parecem mesmo. Tem mãos com a gente, descasca bananas como a gente, alguns anda mesmo de pé como a gente. Não fala, mas a gente entendemos os animais. Pela chipala, riem-se como a gente. Lhe disseram que são os que chegaram antes de nós e por isso somos descendentes deles. Sabe-se lá.

Chega lá em cima, ergue-se para ver se o astro abre, farto de chuva, mas com tiros nem dá por ela. Molhado mas feliz. Do alto de uma mafumeira um relâmpado. Nem sente nada. A perna pende-lhe presa por tendões ou pele ou lá o que é. Já, já, já, ajudem que o ganapo esvai-se em sangue, ainda morre. Não morreu. Não morre. O cabo enfermeiro já lhe fez o garrote por cima do que era o joelho e tanta força fez que a seiva foi estancando.

De olhos bem abertos, Vicente Candumbo – ou é um homem aos dezasseis anos, ou não é, um gato é que é bicho – sussurra um obrigado esvaído. O chofer segura-lhe a cabeça, vais chegar ao Negage e se for preciso, hospital militar de Luanda. Ele sabe. Com uma perna dessas, julgo que é uma pótese ou assim, ficas fino. Um minúsculo sorriso, outro obrigado, agora mais audível.

Há mais malta à sua volta. Trazem-lhe mangas frescas da arca com gelo. Um cigarrito? Queres? Venha ele, um AC com filtro e tudo. Rapaz fica com o maço e os fósforos. Ajuda. O MVL já segue. A chuva parou. Olha pá, tens de acrescentar mais um aos feridos, o gaiato. O que queria ser tropa.

segunda-feira, agosto 14, 2006





MEILE BOQUES

Missiva para o Herculano


Vocemecê estraga-me com mimos, aliás indevidos. De todas as maneiras, é uma gentileza, são tegatés que não posso ignorar.

Com que então é meu leitor há muitos anos? É muito bem feito! Só um espírito benfazejo e caridoso poderia aturar-me desde que escrevo, o que terá acontecido no paleolítico inferior, se der crédito ao que dizem e ao próprio Spielberg. No entanto, eu mesmo tenho dúvidas, não sãotomenses porque já fui católico e curei-me, mas sistemáticas, sobre a identificação de tais escritos. Nem o carbono me convence e não me lembro de ter estado alguma vez em Foz Côa, muito menos em Altamira. É assim a vida.

Dos nomes que me cita, alguns trazem-me boas recordações, como por exemplo a autora da «Rosa, minha irmã rosa», a querida Alice Vieira ou o João Fonseca. E ponto. Do «Diário de Notícias» guardo um respeito e uma admiração grandes. Principalmente do «meu DN». Também não faço mais comentários.

Se me der licença, passarei a inclui-lo – é uma mentira piedosa, já o incluí – na minha adress list. Receberá, se não me insultar, anedotas e oitras sandices, como diria o Fernão, de muá ou dos restantes loucos meus correspondentes, nos quais Vosmicê ficou incluído. No caso de considerar que elas são inconvenientes, pornosaturantes, esmasiadas & similares, nada de hesitações: mande-me à merda, com ou sem aviso prévio.

Aliás, isto de confusões, lembra-me um slogan que existia no tempo da antiga senhora. Nada de confusões; ruas prós automóveis; passeios para os peões. Hoje penso que a versão deve ser outra. Nada de confusões; passeios prós automóveis; ruas para os peões. Tenho dito.

Se entupir a sua mail box – o que é difícil dado ser uma gmail de com e costa – diga-me para ir à outra banda, de preferência de cacilheiro GT. Os imeiles (ou imilios) que seguem, pode arquivá-los na Cesta Secção. Estou habituado a que tal aconteça, pois a maioria dos Amigos a quem chateio, têm um coração enorme e uma paciência-de-job. Por tal motivo, não me dizem nada – mas arquivam.

Estive no herculanodacos.etc.com. Bom blogue e boas meninas. Boas porque, creio, dão esmolas aos pobrezinhos. Uma delas até me pareceu ser irmã exterior da ordem das Caramelinas Descalças até ao Pescoço. Excelentes exemplares que, penso, serão amigas dos membros – de outras Seculares. Está cada vez mais difícil ganhar honestamente o pão quotidiano (e a lagosta e o caviar e o faisão e assim), éoké.
(Já seguiu por imeile)

sábado, agosto 12, 2006






NOTE BEM

Brecht morreu há 50 anos


Na segunda-feira passam 50 anos sobre a morte de Bertolt Brecht. De modo a assinalar a efeméride, a Alemanha organizou uma série de eventos culturais, que já começaram, que têm lugar no Teatro Berliner Ensemble, fundado pelo próprio dramaturgo. Das várias iniciativas preparadas para assinalar o cinquentenário da morte de Bertolt Brecht avulta a estreia, hoje, de uma nova encenação, por Klaus Maria Brandauer, da «Ópera dos Três Vinténs». Exibida pela primeira vez em 1928, em Berlim, tornou logo Brecht um autor consagrado.

Por sua vez, o Berliner Ensemble presta homenagem ao seu fundador com o Festival Brecht. «Brecht é o único dramaturgo alemão de fama mundial, e continua perene no nosso tempo”, disse o actual director artístico do Berliner Ensemble, Claus Peymann, referindo-se ao grande autor falecido aos 58 anos em Berlim-Leste, na RDA, o país comunista que escolheu para viver, após o fim da II Guerra Mundial e o seu exílio nos EUA, para fugir ao regime nazi. Brecht está também a ser homenageado na sua terra natal, em Augsburg, com um festival internacional de literatura.

Os alemães conhecem mal o seu maior dramaturgo, segundo uma sondagem da revista literária Buecher. O inquérito de opinião revelou que 42 por cento dos alemães nunca leu um texto de Brecht, que escreveu 2.334 poemas, mais de 30 peças de teatro, 3 romances e uma centena de trabalhos em prosa ao longo da sua vida, além dos diários e de numerosa correspondência.

A actriz Alina Vaz, que integrou o primeiro elenco que interpretou Bertolt Brecht em Portugal, há 30 anos, considera que meio século depois da morte daquele dramaturgo, as suas peças continuam “actuais” e “a fazer-nos pensar”.“Antes do 25 de Abril de 1974 a companhia da actriz Della Costa tentou apresentar uma peça de Brecht num teatro do Parque Mayer mas foi impedida pela Censura”, recordou a actriz, que em 1976, sob a direcção de Carlos Avilez, encarnou a personagem Polly na peça «Opera dos Três Vinténs».

(In Primeiro de Janeiro, com adaptações)

quinta-feira, agosto 10, 2006



Poeira do Leste

Antunes Ferreira
Lábios carnudos e morenos como os da Laurinda, morena e carnuda, jura mesmo que não há. Seios empinados e arfantes como os da Laurinda, morena e carnuda, nem pensar. Ventre liso e duro como o da morena e carnuda Laurinda, nunca. E o umbigo, cinzelado, da Laurinda, morena e carnuda? Jamais outro igual. Perfeitinho, a parteira sabia da poda e devia ter mãos de fada e aveludadas, tal obra produzira.

Pernas longas, torneadas, artelhos de mimo e coxas de mármore moreno e carnudo, como as da Laurinda, carnuda e morena, deus me livre se há. E ninho do amor, enovelado a negro, carnudo e moreno, como o da Laurinda, morena e carnuda, nem pó. O pessoal pára na Mutamba só para olhar para ela. Muita gente deixa até passar o maximbombo sem levantar o braço. Mulata assim, nem no Brasil, e olha lá, o Jorge Amado diz que as morenas e carnudas da Baía não têm quem se lhes compare. Enganado anda ele. A Laurinda, carnuda e morena, basta que a veja.

De resto, esse brasileiro pai da Gabriela, do cravo e da canela, sabe de fêmeas. É ele quem escreve que gostaria de dormir com todas as mulheres do Mundo, sem escapar uma. É impossível, seu. Mas tento, mas tento, acrescenta com um riso danado por baixo do bigode. Dona Zélia nem se preocupa. Nunca teve pachorra para ter ciúmes. Nem tempo. E o São Salvador vela por ela, atento.

Nisto tudo pensa João Caxiné, preto cafuso, natural de Benguela, admirador do mulato Aires de Almeida Santos, poeta entre os poetas, preso uns anos em São Nicolau, solto depois, agora jornalista de «A Palavra» do Renato Ramos e do gordo, o Antunes Ferreira. Ele também é de Benguela, nela foi buscar toneladas de inspiração a fim de parir A mulemba secou ou o Meu amor da Rua Onze.

João, o Fosquinhas de alcunha, não soube nunca e não continua a saber porquê, descasca batatas para o rancho geral em Henrique de Carvalho, frente Leste, mortífera. Vai lançando-as cuidadosamente peladas – o sorja Monteiro é lixado no controlo e fiscalização dos comes – no caldeirão. São duas companhias de angolanos como ele e comem que nem elefantes. Nada de capim, porém. Batata, feijão, grão, arroz, toucinho, chouriço de lata, tudo salpicado por mais ou menos carne selvagem, de acordo com a fortuna na caça. Porco ou vaca, só de quando em vez.



A filha da mãe da poeira, finíssima, em suspensão por tudo o que é sítio, entra pela gola da camisola interior. Levanta-se do caixote que lhe serve de banco e a custo despe-a, de tal modo se lhe colou ao corpo, suor e pó misturados, pior do que Pattex. Puta que pariu a camisola. Colada a ele – só a Laurinda, morena e carnuda, uma merda, lá longe nos Combatentes, por cima do Punta del Pazo, vizinha da Marabunta, agora dona de vidraria, noutros tempos, outras vidas, outros amantes de nota na mão, escudos ou angolares tanto faz.

Não a pode esquecer. O que estará ela a fazer a esta hora. Três da tarde, ainda é cedo para preparar o jantar para o pai, os dois irmãos e ela. Vê-a deitada, um camiseiro largo por único vestido, de seda de Macau, comprado nas Ingombotas. Nada por baixo, nadinha, como ela gosta de andar e a ventoinha Sanyo, a mandar-lhe o ar que lhe beija as pernas nuas, por aí acima, até onde ele também a beija – e ela gosta. E ele.

Da Terra à Lua

Pronto. Já está outra vez de pau no ar, nem vê bem as batatas – tubérculos, aprendeu ele na Escola da Dona Mariquinhas ali ao Marçal – esta foi quase decepada pelo facalhão que ele maneja com destreza. Com o pensamento fora, ainda corta um dedo, ou mesmo dois, qual catana bem afiada. Entre a Laurinda, carnuda e morena, e as putas das batatas vai uma distância tão grande como da Terra à Lua, os gringos dizem que um destes dias chegam lá de foguetão, quem sabe, os américas são gajos para tudo.

O cabo Carlos, branco do Chinguar, avisa-o de que está a roubar nas batatas, com casca tão grossa deitada fora, elas nem se vêem cruas, quanto mais cozinhadas. Sacana de merda esse Carlos, sempre a dar-lhe cabo do juízo por tudo e por nada. Agora são os tubér.., os colhões do padre Inácio. Um dia destes, dá-lhe uma sarrafada que o gajo vai ver as estrelas todas do céu. Incluindo as Ursas, a Maior e a Menor, a Cassiopeia e outras de luz mais fraca. Ah Dona Mariquinhas, tanto lhe meteu no cristalino bestunto.

Tás a pensar na miúda, é o que é. Mau. A Laurinda, morena e carnuda, não é para aqui chamada e o Carlos Matos não tem que a meter ao barulho. Ó meu sacana, nada de brincadeiras com a minha noiva, senão fodo-te os cornos. O do Chinguar, pronto, não te chateies, era só uma piada, nada mais, mas se assim o queres não volto a falar na cachopa, não sei o que ela viu em ti para te eleger como conversado.

O panelão já tem mais do que a conta batatal. O China cozinheiro é quem está a seguir na bicha do refogado. Estrugido dizem os portuenses, que gajos mais estranhos, sarjeta é bueiro, vinte e oito é bintóito e dezoito é dezouito, bica é cimbalino. Há doze no agrupamento, uns mesmo do Porto, Cedofeita e Maia, dois da Póvoa, um de Leixões, outro de Espinho e não sabe mais quê. Malta despachada.



Vai devagarinho para o jotacê, assim chamam aos barracões das casernas. Estende-se no colchão, de barriga para o ar, mete as mãos debaixo da nuca, tem vontade de um cigarro, mas não a tem de o ir buscar ao bolso do camuflado. Está empapado e daí a bocado irá meter-se debaixo do chuveiro. O calor seco, o tempo abafado, as nuvens baixas e a cabrona da poeira peneirada são impossíveis. Mornaço muito pior do que em Luanda, sem falar nas praias da ilha.

Noites e noite, aquela

Uma noite pegara na Vespa e fora buscar a Laurinda, morena e carnuda, a casa, para darem uma volta pela ilha. O pai dela de acordo, a mãe, menina toma cuidado, os homens são todos iguais, tento na cabeça. Duas Nocais no bar do senhor Jeremias, mais duas bem geladinhas e olha o mar calmo e azul escuro, é noite, amor. Areia morna melhor que colchão molaflex, ninguém à vista, o boteco já fechou. As mãos ardendo, agarram os seios firmes morenos e carnudos e a boca esmaga os lábios carnudos e morenos.

Entre as pernas cresce-lhe o volume orgulhosamente em pé. Ela acaricia-o, mão já especialista nesse tronco, passa-lhe os dedos pelos encaracolados pelos e vai abrindo as gâmbias. Ele corresponde, avança com o dedo do meio no meio dela, gemem, ai João que me matas, estou desvairada, oh não, oh não, oh sim, oh siiiiiim. Por ali não ficam. Os beijos trocados, os mamilos morenos e carnudos aleitam–lhe o desejo.

E quando entra nela, e vai acelerando a cavalgada, os gemidos transformam-se em gritos estridentes, mais fundo, mais fundo, maaaaiiiiiis. Um mar leitoso envolve os dois, a lua cheia parece de prata, um cigarro de boca pra boca, os dentinhos dela, certinhos, bonitos, reluzem em explosão de esmalte, era bom ficar aqui para sempre contigo, sem mais fazer. Deixa-te estar. Daqui a pouco vais. Mas espero por ti. Aqui.

Três dias depois, o Leste. Aqui é uma porra. Só das lembranças da Laurinda, carnuda e morena, já tem o slip aleitado, gomoso e nem precisou de usar a mão. Ai amor, como eu te queria abraçar agora mesmo e afagar a tua barriguinha de sete meses, aquela noite na ilha pegou de estaca, vem chegando aí alguém, já dá pontapés no ventre materno, menino ou menina não se sabe, só quando sair para a rua. Futebolista será – se macho.

Notícias de Luanda

Começa a levantar-se, mole, para ir-se à chuveirada. O alferes Oliveira entra na caserna e dirige-se a ele. O que há, meu alferes? Senta-te que eu quero dar-te uma notícia. Sentar-me? Para quê? Que houve? Os sacanas atacaram a nossa malta e mataram algum camarada? Ou mais? Deve ter sido afastado, não se ouviram tiros, pelo menos eu cá não os ouvi. Mas ainda podemos lá ir, dar-lhes uma ajuda e ferrar umas porradas nesses filhos das putas.





João, não é nada disso. Veio um rádio de Luanda para te avisarmos. Ó meu alferes, dê-me um abraço dos grandes, já vi tudo, sou pai, nasceu a criança, morro de alegria, é menino ou menina? Diga lá e já. Para mim é igual, desde que seja perfeitinho. Chico Oliveira põe-lhe as mãos nos ombros, mas não é abraço, é peso, é carrego, que merda é esta, que se passa meu alferes? A cor azeitonada tornou-se cinzenta e baça. O que é, meu alferes, o que é?

À porta do jotacê juntou-se um grupo, o Carlos do Chinguar com cara de pau faz parte dele, tudo calado. Ó meu alferes. João, o bebé perdeu-se. Uma complicação qualquer durante o parto, já saiu morto, uma ganda chatice. Foda-se! Puta de vida esta, pois não é, meu alferes? Mas nada de tristezas pela desgraça, quem fez um faz outro, fica para a outra, vamos tentar de novo, é fácil fazer uma criança, a minha Laurinda, morena e carnuda, até gostou desta vez e vai gostar ainda mais.

Não, João, não vai haver mais vez nenhuma, infelizmente. O quê? Estás a gozar comigo? Dou-te cabo da cornadura ó Oliveira, eu nem estou em mim, eu perco-me. Vais ter de aguentar, soldado. A Laurinda, carnuda e morena, também se foi, ainda chamaram o médico, não houve como valer-lhe, uma hemorragia lixada. Os funerais das duas – era uma menina – são daqui a três dias, para te dar tempo a lá chegares. Amanhã vem o helicóptero e tu vais nele, que achas?

Não acha nada, Os outros vão entrando, o Carlos chora, alguns também, grossas lágrimas rolam pelas faces de peles diferentes. Ele, porem, está seco. Morreu por dentro. Acabou também. A Laurinda morena e carnuda agora só se deitará com os vermes. Vira um homem desenterrado e não comera arroz uma porrada de tempo, os bagos brancos saíam aos milhões do corpo apodrecido, saracoteando-se.

Não vou, meu alferes. Muito obrigado, mas não vou a Luanda. Vou para a mata, voluntário e, se puder, fico por lá uns dias. Uma emboscada, um golpe de mão, até mesmo uma patrulha, mas que dê para uns dias. Sempre dá tempo para apanhar uma mina ou um fogacho na testa. Assim, volto a experimentar com a Laurinda, morena e carnuda.