sábado, fevereiro 17, 2007
Muito mais do que cachaça
* Ninguém – a não ser os próprios brasileiros – levava muito a sério o investimento do país do Carnaval na produção de etanol.
Mónica Bello
Há uns anos, aterrava-se numa cidade brasileira e os sentidos eram invadidos por um estranho cheiro amargo-doce que, ao contrário do que se poderia esperar, não se encontrava no fundo de um copo de cachaça. Nos anos 90, a indústria automóvel europeia (e norte-americana) mantinha-se empedernida, conservadoramente dependente do petróleo, surda aos avisos sobre os efeitos do aquecimento global e a anos-luz dos motores movidos a álcool. Ninguém – a não ser os próprios brasileiros – levava muito a sério o investimento do país do Carnaval na produção de etanol.
No espaço de uma década, tudo isto mudou e aquilo que era considerado um exotismo, está, hoje, promovido a um dos maiores negócios do novo século – sobretudo depois do grande “empurrão” dado pelo presidente norte-americano no discurso deste ano do “Estado da Nação”, em que Bush estabeleceu a meta de reduzir em 20% o consumo nacional de gasolina nos próximos dez anos. Ou seja, diminuir para 1/4 as importações do petróleo provenientes dessa zona do mundo incontrolável, que dá enormes dores de cabeça e se chama Médio Oriente. Nos EUA, a chamada presidencial pró-etanol não ficou sem resposta, até porque vão chover ajudas aos produtores nacionais de combustíveis mais “limpos”. E da indústria automóvel chegou também um sinal. Uma semana depois do discurso de Bush, as séries Indy arrancaram em Daytona para uma época 2007 “100% etanol”. E se os 650 cavalos de cada um destes Honda V8 de 3,5 litros não se queixam dos vapores alcoólicos, sobram poucos argumentos para a não reconversão da generalidade da indústria dos automóveis de trazer por casa.
No Brasil, maior produtor e consumidor mundial de etanol, a rainha deste novo “ouro verde” é a cana-de-açúcar. Com plantações que cobrem 2,35 milhões de hectares, a produção alimenta três indústrias: a do açúcar, a da energia eléctrica e a do álcool, sendo responsável, ainda, por 6% de todos os empregos do país. É o futuro. Ou é isso, pelo menos, que pensam os multimilionários do costume: ao café e algodão brasileiros, George Soros juntou no ano passado o etanol, Bill Gates investiu em três novas fábricas de etanol e os fundadores do Google também já anunciaram a intenção de seguir pelo mesmo caminho. Ali ao lado, no Peru, com as plantações de cana, de novo, nas mãos dos privados e um acordo de comércio livre assinado com os EUA, sucedem-se os investimentos – espanhóis, norte-americanos e brasileiros. E o panorama repete-se mais a Norte, na Colômbia e República Dominicana.
Quase 500 anos depois do português Martim Afonso de Sousa ter levado a cana-de-açúcar para a América do Sul, não deixa de ser irónica a ausência dos grandes investidores portugueses da energia (onde o Governo de Sócrates mantém a última palavra) neste novo filão do comércio mundial. EDP e Galp têm aumentado a presença no Brasil. Mas, até agora, sem açúcar.
Imperdível mas perdoável
Ora pronto. Mais um a juntar ao de baixo… De novo o blog da nossa Embaixada em Brasília. Daí que, reincidente e contumaz, o que me resta é, tão-só, repetir o que ali digo no que concerne a agradecimentos. Mas também, aplaudir a Mónica Bello (mbello@economicasgps.com) que aborda uma questão de uma tão grande importância – e fá-lo de forma simples, informada e compreensível para o comum dos mortais. Parabéns Mónica. E, por extensão, ao Diário Económico, onde ela é gente importante. Ao qual não pedi autorização para esta transcrição. Penso que estou perdoado. A.F.
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3 comentários:
Como eu gostava de conhecer o Brasil e, sobretudo, as brasileiras; as tecnologias, está visto
Se a moda pega entre nós, lá se vai a nossa bagaceira, o medronho e as aguardentes velhas...
Os avanços registados no Brasil, a nível tecnológico, por exemplo, bem nos podem ajudar aqui em Portugal. Creio que a nossa Embaixada em Brasília está a trabalhar a todo o gás. Basta ver o blog dela, excelente iniciativa e creio que única.
Vamos trabalhar em conjunto, unir esforços e saberes e veremos que dá resultados muito interessantes.
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