segunda-feira, julho 28, 2008




REFERÊNCIAS



A língua do mar

Francisco Seixas da Costa*
N
o ano em que todos quantos se exprimem em Português celebram o nascimento, há quatro séculos, do Padre António Vieira, um dos seus mais brilhantes cultores, não deixa de ser interessante que a reunião de cúpula da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada em Lisboa, tivesse, precisamente, o tema da língua no centro da sua agenda.

O Português é, sem sombra de dúvida, uma das quatro grandes línguas de cultura do mundo, não obstante outras poderem ter mais falantes. Nessa língua se exprimem civilizações muito diferentes, da África a Timor, da América à Europa – sem contar com milhões de pessoas em diversas comunidades espalhadas pelo mundo.

Essa riqueza que nos é comum, que nos traz uma literatura com matizes derivadas de influências culturais muito diversas, bem como sonoridades e musicalidades bem distintas, traz-nos também a responsabilidade de termos de cuidar da sua preservação e da sua promoção.

A Língua Portuguesa não é propriedade de nenhum país, é de quem nela se exprime. Não assenta hoje – nem assentará nunca – em normas fonéticas ou sintácticas únicas, da mesma maneira que as palavras usadas pelos falantes em cada país constituem um imenso e inesgotável manancial de termos, com origens muito diversas, que só o tempo e as trocas culturais podem ajudar a serem conhecidos melhor por todos.



Mas porque é importante que, no plano externo, a forma escrita do Português se possa mostrar, tanto quanto possível, uniforme, de modo a poder prestigiar-se como uma língua internacional de referência, têm vindo a ser feitas tentativas para que caminhemos na direcção de uma ortografia comum.

Será isso possível? Provavelmente nunca chegaremos a uma Língua Portuguesa que seja escrita de um modo exactamente igual por todos quantos a falam de formas bem diferentes. Mas o Acordo Ortográfico que está em curso de aplicação pode ajudar muito a evitar que a grafia da Língua Portuguesa se vá afastando cada vez mais.

O Acordo Ortográfico entre os então “sete” países membros da CPLP (Timor-Leste não era ainda independente, à época) foi assinado em 1990 e o próprio texto previa a sua entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1994, desde que todos esses “sete” o tivessem ratificado até então.


Quero aproveitar para sublinhar uma realidade muitas vezes escamoteada: Portugal foi o primeiro país a ratificar o Acordo Ortográfico, logo em 1991. Se todos os restantes Estados da CPLP tivessem procedido de forma idêntica, desde 1994 que a nossa escrita seria já bastante mais próxima.

Porque assim não aconteceu, foi necessário criar Protocolos Adicionais, o primeiro para eliminar a data de 1994, que a realidade ultrapassara, e o segundo para incluir Timor-Leste e para criar a possibilidade de implementar o Acordo apenas com três ratificações.

Na votação que o parlamento português fez, há escassos meses, desse segundo Protocolo, apenas três votos se expressaram contra. Isto prova bem que, no plano oficial, há em Portugal uma firme determinação de colocar o Acordo em vigor, não obstante existirem, na sociedade civil portuguesa – como aliás, acontece em outros países, mesmo no Brasil -, vozes que o acham inadequado ou irrelevante.

O Governo português aprovou, recentemente, a criação de um fundo para a promoção da Língua Portuguesa, dotado com uma verba inicial de 30 milhões de euros e aberto à contribuição de outros países. Esperamos que esta medida, ligada às decisões comuns que agora saíram da Cúpula de Lisboa da CPLP, possa ajudar a dar início a um tempo novo para que o Português se firme cada vez mais no mundo, como instrumento de poder e de influência de quantos o utilizam.

A Língua portuguesa é um bem precioso que une povos que o mar separa mas que a afectividade aproxima. Como escrevia o escritor lusitano Virgílio Ferreira

Da minha língua vê-se o mar.
Da minha língua ouve-se o seu rumor,
como da de outros se ouvirá o da floresta
ou o silêncio do deserto.
Por isso a voz do mar
foi a da nossa inquietação.

* Embaixador de Portugal no Brasil

Um Embaixador bué da fixe

O Travessa tem muito prazer e muita honra de abrir uma nova secção REFERÊNCIAS com um excelente texto do Francisco Seixas da Costa, Embaixador de Portugal no Brasil - e meu grande Amigo. O artigo foi hoje mesmo (2008/07/28) publicado no diário «O Globo» e aqui o transcrevo, mesmo sem a autorização do jornal, muito menos do Autor. Sabe-se, porém, como sou um desavergonhado.


O Chico Seixas da Costa, é bué da fixe, como me ensinaram os meus netos, e, quiçá, o melhor diplomata português na actualidade. Para mim, é. (A Amizade não é lisonja, garanto, e quanto a exagero, nem pó...). E tem vindo a fazer uma obra magnífica em terras de Santa Cruz. As relações ente os dois países muito lhe devem, e em todos os domínios. Ele sabe dinamizá-las, desenvolvê-las, entrosá-las de uma maneira que nunca é demais referir e encomiar.
Quando este blogue engatinha ainda no que pretende vir a ser uma caminhada firme e apoiada - o PONTO DE ENCONTRO que tenho vindo a referir e que, felizmente, muitos já apoiam - a publicação deste trabalho do Embaixador é muito importante. A nossa Língua, comum a muitos milhões de seres humanos, encontra-se em momento crucial: o de alcançar, de pleno, o lugar a que tem inteiro direito . Com Acordo - ou sem...
Volte por aqui, querido Amigo. Para continuar. A.F.

1 comentário:

_E se eu fosse puta...Tu lias?_ disse...

Sarava!

Gostei deste post!
Até porque tenho visto uma enchente de blogs contra o acordo ortográfico...
e após ler sobre o assunto e ouvir o ministro a falar até às 3h da manhã reforcei o meu voto a favor.~

Ele refutou os argumentos dos países como Inglaterra/EUA; etc etc etc...

E Se Pessoa continuou a escrever cisne com y (cysne) porque o y lhe fazia lembrar o pescoço do mesmo... é exemplo vivo que cada pessoa escreve como quer (´n é crime!!), logo... já se escreveu mãe de 3 formas diferentes e a mãe continuou a ser sempre a mesma!!


blá blá blá

beijinhossssss