quarta-feira, janeiro 16, 2008



A vitória augusta


Pedro Santos Guerreiro (psg@mediafin.pt)
S
im, é um novo princípio, uma outra dinastia no Millennium, um BCP 2:0; a “second life” de um banco que foi humilhado por accionistas e gestores que sobrepuseram as suas agendas pessoais aos interesses da instituição. A sandice deplorável e degenerativa só podia ter solução externa.

Ei-la: Carlos Santos Ferreira é “ecce hommo”.

A corja passou a troika, a facção virou coligação e há um presidente com salvo-conduto para impor o que quiser. Ter 97,8% numa votação contra Miguel Cadilhe vale mais que todos os 100% que Jardim Gonçalves alcançou em listas únicas vinte anos a fio. Santos Ferreira é o José Sócrates do BCP: alcança a maioria absoluta de quem não suporta mais a instabilidade.

Uma votação tão implacável só pode revelar ou grande confiança ou enorme desespero. É irrelevante: confere uma legitimidade à prova de bala. A todos que acusarem Santos Ferreira e Vara de levarem o PS para a Rua Augusta haverá uma resposta pronta: no-ven-ta-e-sete-por-cen-to. O resto é conversa.

OK, mas um pouco mais de conversa. Continua a ser indisfarçável a politização de todo este processo, desde um Governo que no mínimo anuiu que líderes da Caixa fossem para a concorrência até uma oposição obcecada em liderar uma “Operação Mãos Limpas”, que coloca pressão sobre Constâncio e Teixeira dos Santos e, ironicamente, a desvia dos putativos perpetradores, os administradores do BCP.

Há Estado a mais neste processo? Há. Estado e partidos a mais. Mas a responsabilidade é dos accionistas privados, que tornaram o BCP carente de uma solução como esta. É por isso que Cadilhe se sente vexado. Mas admitamos: o maior vexame dos últimos meses foi dado pelos privados.

Armando Vara tem agora a oportunidade de mostrar que todos os seus detractores estão errados. Santos Ferreira já não precisa disso: ele sai glorificado. E começou de uma maneira sintomática: podia ter saído ontem em ombros da Alfândega, com sorrisos que hoje pintariam todas as primeiras páginas do País; abdicou dessa demonstração de força e de vitória, até dessa vaidade conquistada, para mostrar que daqui para a frente será diferente. É como quem diz: acabou-se o espectáculo, vamos ao trabalho.

E que trabalho: recuperar a credibilidade nos mercados bolsistas, resgatar a dignidade dos trabalhadores, repor a reputação face aos clientes. O “timing” não podia ser pior para Santos Ferreira. A banca americana agoniza com prejuízos aterradores e arrasta as bolsas para o fundo. O “subprime” é um vírus por debelar, que contagia justos e pecadores. Os accionistas continuam cindidos, alguns carregam rancores e feridas de morte, o que supõe uma clarificação accionista, entradas e saídas. O que fará o BPI? E a Sonangol?

É preciso saber quem manda agora no BCP. O que é muito mais difícil do que parece, até porque há accionistas (como os há pequenos investidores) que compraram acções acima dos quatro euros e perderam um terço do seu dinheiro num punhado de meses. Veja-se Joe Berardo: é um enorme vencedor desta sucessão inverosímil de assembleias gerais, mas carrega um enorme prejuízo potencial do seu investimento.

Para que o BCP chegue ao céu, Santos Ferreira vai ter de atravessar o inferno. De resultados financeiros, de motivação, de suspeitas de politização, de investigações ao banco. Mas o BCP passou finalmente a ter um presidente ao volante e não no lugar do morto. Já fomos a votos. Agora vamos lá falar de banca outra vez.

Um Jornalista e um Jornal

Não tenho dúvidas de que se tratou (e trata) de um verdadeiro caso de amor à primeira vista, salvo seja. O Pedro Santos Guerreiro é um Jornalista sério e a sério. Dirige com mão segura, de timoneiro, o barco que se chama Jornal de Negócios. Que não mete água. O navio, diário. Muito menos o comandante.

Nesta farsa – que chegou a drama – do BCP-Millennium, PSG teve oportunidade de demonstrar o valor que lhe é reconhecido. Talvez fosse melhor eu ter utilizado apenas mostrar. Porque quanto à sua qualidade, Pedro Guerreiro não necessita de arguir o que quer que seja em sua defesa, pois não precisa dela, defesa. É o que é – e basta-lhe.

O Jornal de Negócios atingiu esta terça-feira 904.327 notícias lidas, um novo recorde diário, segundo dados auditados pela Marktest. O matutino é líder de audiências na informação económica, com 436 mil utilizadores únicos em Dezembro, pode ler-se na sua edição de hoje, quarta-feira. Só para se fazer uma comparação, estes números são o triplo dos que o "Diário Económico" apresenta.


Uma parte substancial desta performance deve-se a quem dirige, ou seja a Pedro Santos Guerreiro. A marca que imprimiu ao diário é substantiva e directa, não entra por caminhos ínvios, não pactua com aventuras fáceis, não altera o rumo que a si próprio se impôs face a pressões da ordem mais diversa.

O Travessa do Ferreira honra-se de, uma vez mais, registar o editorial de hoje, assinado pelo PSG. Nada de rodriguinhos, nada de circunlóquios, nada de encómios desnaturados. Opinião verdadeira, clara, desinteressada, correcta, independente. O segundo maior banco português, o primeiro dos privados, vai ter de ultrapassar os enormes escolhos que tem pela frente.

Mas, tal como Pessoa escreveu a propósito da vitória dos Portugueses sobre o Adamastor, Carlos Santos Ferreira vai ter de se suplantar para ganhar a batalha, a guerra, e o Millennium. Vai ter de solucionar, sem medos, mas com o quantum satis inevitável, o imenso problema em que o BCP se converteu, sob pena de ocorrer um naufrágio impensável, mas possível. Recordo o poeta:

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
"Aqui ao leme sou mais do que eu (…)
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo (…)
Manda a vontade, que me ata ao leme” (…)

Penso que o vai conseguir. Oxalá. Por isso, estou, uma vez mais, com o Pedro Santos Guerreiro. Por isso, repito, o transcrevo, uma outra vez, neste blogue. A.F.


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