sábado, maio 12, 2007



O 1º desmaio

Hélder Fernando
Correspondente na RAEM

Vários sectores da governação, nestes anos de sete e meio, já sofreram alguns abalos. O sismo “mãos longas” fez tremer, mas não deitou a casa abaixo, pelo menos, por enquanto. Até que, no Dia do Trabalhador, apareceu o 1º desmaio. Uma mão cheia de tolices e orgulhos de caserna e camarata deitaram muita coisa a perder.

Se meia dúzia de desordeiros, aproveitando o desfile, fizeram disparates (a cena lastimável junto à casa mortuária foi um deles), os organizadores da manifestação deviam, imediatamente, tê-los expulsado da concentração.

Se entre as associações que organizaram o protesto há gente manifestamente impreparada para dialogar com as autoridades constituídas – gente porventura inútil para qualquer género de diálogo em sociedade – da próxima vez não metam tal gente nestas coisas, vale mais passarem-lhe guia de marcha para seguirem o conselho de Florinda Chan e rezarem pelos manifestantes.

Do outro lado das barricadas, se existe alguém sem cultura policial ao serviço de uma sociedade civilizada, sem percepção sobre comportamentos de grupo, sem preparação humana para impor a calma e não o pânico, exactamente no momento em que isso é mais necessário, devem esses elementos mudar de profissão, serem destinados a outras tarefas ou terem formação adequada.


Tal como não deve um policial desatar aos tiros no meio de pessoas desarmadas, porque alguém perdeu um chinelo, também um comandante policial, mesmo substituto, deve evitar o exercício de carregada ironia, ao afirmar que a força policial só usa balas verdadeiras. Descontrolo, arrogância evitável e ainda por cima afirmação não verdadeira. Qualquer polícia do mundo, incluindo Macau, mesmo em situações de dimensão e grau de violência muitíssimo superiores, utiliza outros processos e outras munições não reais.

Os truques utilizados pelas forças policiais no sentido de dividir os manifestantes, resultaram em actos de grosseria. Qualquer polícia para ser respeitada, tem de dar-se ao respeito, respeitando as atitudes do cidadão desde que sejam legais. A manifestação estava autorizada. Independentemente das discussões sobre alguns locais de passagem – que resultaram no tal nítido défice de diálogo entre as partes – é altamente provocatório deterem-se organizadores do protesto e, também à força, separarem-se os manifestantes com gradeamentos e cordões policiais. Imagine-se o que seria com cidadãos extremistas, violentos e em muito maior número.

Os manifestantes não empunhavam armas de fogo nem coqueteiles molotov nem facas nem canivetes nem varapaus nem fisgas. E havia mulheres que empunhavam flores. Somente as vozes gritavam, legalmente, sobre a vida que não corre bem a boa parte do povo de Macau. Circunstância que não é novidade, apesar de ouvir falar das fabulosas fortunas arrecadadas na região por privados e, consequentemente, pelo orçamento oficial. Se a força policial, por algum instante, sentiu necessidade de fazer actuar um plano de emergência, esse plano terá sido mal escolhido ou então mal interpretado no terreno.

Já foi condenado, ao mais alto nível da administração da RAEM, o acto, de aparência esquizofrénica e afirmadamente não autorizado, de um agente disparar meia dúzia de tiros reais para o ar, com o perigo de serem atingidas pessoas debruçadas imediatamente por cima, numa passadeira aérea para peões. Como contraponto inevitável, lá vieram afirmações oficiais (que toda a gente compreende) louvando o comportamento policial durante a manifestação. Macau gosta mesmo de dar a imagem de terra de equilíbrios. Mais do que terra harmoniosa, pelos vistos.

Os policiais são seres humanos e muitas vezes a vida também não lhes correrá lá muito bem. Devem eles saber, tal como devem saber os governantes, que, mesmo circunstancialmente, existe uma coisa que se chama desespero humano. Desespero que vem da esperança que passou a dúvida que passou a desilusão. Mais tarde ou mais cedo as pessoas podem ter motivos de descrença. Então irritam-se, desesperam e manifestam-se. Sejam 6, 600 ou 6000. E a RAEM não precisa deste tipo de manifestações para provar ao mundo que, como prometido, vive, a prazo, no tal “2º Sistema”. Estes protestos, em Macau, provam nada. Como se sabe, na China continental registam-se manifestações muito maiores e muito mais violentas.

No 1º de Maio deste ano – que foi o 1º desmaio oficial (felizmente socorrido a tempo pelo próprio chefe do executivo, pessoa que desejará tudo menos atitudes destas), os manifestantes não protestaram contra o regime legal instituído. Protestaram contra a falta de se realizarem, em todos os sectores, políticas efectivamente a favor do equilíbrio social.
(In Hoje Macau)



O correspondente em Macau

Isto cresce. Hoje, um outro colaborador. Não digo novo, porque o Hélder Fernando já não é propriamente um júnior. Também ainda não chegou a velhadas como eu. É um sénior, diga-se, moçambicano que aterrou em Macau já lá vão uns largos anos, depois de passagem abreviada por esta nesga de terra banhada pelo Atlântico.

Chegou e ficou. Nesta altura, já tem os olhos mais em bico do que muitos amarelos. Ninguém o tira de lá. É jornalista, já fez de tudo, jornais, revistas, televisão, rádio. É, porem. Nesta última que diz sentir-se mais à vontade. Não creio que o novo elemento, desde já correspondente da Travessa na RAEM, precise de o dizer. A sua voz já encantava as gentes da antiga colónia portuguesa na costa oriental de África. Por onde passou, assim aconteceu. E pronto.

Aqui neste blogue faltar-lhe-á o microfone. Pelo menos, por enquanto. Mas as suas prosas, essas, começam hoje, ainda que, para já, em transcrição do jornal Hoje Macau a quem agradeço a autorização que me teria dado – se eu lha tivesse pedido. O que devia obrigatoriamente ter feito – mas não fiz. Sou, continuo a ser, um iconoclasta.

O Hélder vai mesmo – ele o prometeu – passar a ter nesta casa que também é dele textos originais. Num blogue onde Macau tem sido objecto de bastantes e diversas abordagens, as suas prosas são muito bem vindas. Pelo conhecimento de décadas que tem daquela Região, pelo pendor orientalista que possui, pelo simples facto de, para alem de Amigo, ser um Jornalista com caixa alta. Cá estamos, ó Hélder Fernando.
A.F.

1 comentário:

Anónimo disse...

Este blog até parece a Região Edministrativa Especial da Macacada com tanto Macaco, com tanto Macau. Só cá faltava este...