quinta-feira, abril 19, 2007



As gajas são lixadas

José Fanha
O meu amigo Helder levou ontem um medíocre da nossa professora e, quando chegou ao recreio, pôs-me uma mão no ombro e disse-me com cara de quem sabe muito bem do que é que está a falar: “Sabes o que eu te digo, pá? As gajas são lixadas!”

Fiquei.-me com aquela. Se o Helder dizia é porque devia ser verdade. Eu é que andava distraído e nunca tinha pensado a fundo nesses assuntos relacionados com gajas. Mas pensando bem, pensando bem, o Helder tinha toda a razão. Verdade, verdadinha: “As gajas são lixadas”.

Bastava lembrar-me da Armandinha que em vez de me dar os cromos das pastilhas elásticas preferia deitá-los para o caixote do lixo só para me irritar. E da Célia, a quem pedi namoro e se desatou a rir. E da Joana que todos os dias me dizia que eu tinha cara de sapo engasgado.

O Helder tinha mesmo razão. Quando fui para casa, ia a repetir cá para comigo: ”As gajas são lixadas! As gajas são mesmo lixadas!” Olhava para cada mulher que passava por mim na rua e pensava: “Tu és uma gaja lixada!” Vinha outra... “Tu também és uma gaja lixada!”

Cheguei a casa a repetir baixinho “As gajas são lixadas! As gajas são...”, e olhei para a minha avó, “As gajas são...” “O que é que vens a dizer, filho?”, perguntou-me ela. Eu nem disse nada. Fiquei corado desde o calcanhar até ao alto da cabeça. Ela a querer saber o que é que eu tinha, e eu que não tinha nada. Nadinha.

Ai não que não tinha! Fui logo a correr para o meu quarto e pus-me a pensar muito depressa que é a única maneira de pensar quando estamos aflitinhos.


Até o Fanha

Antunes Ferreira
Há um montão de anos que não encontrava o Zé Fanha. Conhecemo-nos, vejam lá, por alturas da Cornélia, uma Senhora Vaca de saudosa memória, de quando a RTP era a Um e a Dois e ponto. Mas, este modesto escriba foi seguindo sempre com atenção o percurso do bigodaças, e, sobretudo, quando ele plantou na face uma barba hirsuta e desorganizada. Tal pai…

E, de repente, no jantar das I Jornadas da FAÚMA, a Associação que reúne voluntários amigos e familiares dos doentes mentais do Júlio de Matos e da qual já aqui falei, eis que surge, vindo do antanho, mas não envolto em nevoeiro, abrenúncio, o dito cujo. Foi o reencontro de dois gordos assumidos, um célebre, outro um servidor modesto e desinteressado. E desinteressante.

O propriamente dito Fanha vinha fazer uma das mil e tantas coisas que, tal como se cozinha o bacalhau, ele sabe fazer, faz e faz muito bem: declamar poesia. Desnecessário e despiciendo seria enumerar aqui os itens da panóplia que o tipo usa. Dir-se-ia um plágio, aliás miserável, da Lista Telefónica, das páginas brancas e das amarelas, sem necessidade de ir pelos nossos dedos, pois ele vai.

Uma assistência atenta, mas nunca veneradora e obrigada, seguiu os momentos mágicos que o Zé lhe transmitiu, como sempre acontece. O raio do Homem é um perigoso rival do Vinho do Porto – e não digo porquê. Está cada vez melhor. Porra: disse. Cresceram-lhe a barriga, os apêndices capilares e o engenho e a arte.

No meio da enorme alegria do reencontro, uma se possível ainda «mais grande», pleonasticamente falando: os textos. Os poemas foram desfilando, à solta, enroupados na voz inconfundível do Fanha e na forma excelente de os dizer. Aí, seu homem! O João Villaret, o Manuel Lereno, o Mário Viegas, o José Jorge Letria, e tantos outros, estavam ali presentes para o ouvir também.

No fim, por entre cumprimentos e agradecimentos, ainda tive tempo para lhe pedir permissão para publicar neste blogue excertos de uma coisinha deliciosa que o bom malandro – perdoa-me, Zambujal – editou recentemente: «Diário Inventado de um Menino já Crescido». Pois o Zé fez mais do que dar-me a autorização: mandou-me os textos do grande livrinho. Está dito.

É assim que o Travessa do Ferreira passa a publicar textos assinados pelo José Fanha. Desvanecimento e honra é o que não me falta, bem pelo contrário. Babadinho. Nova colaboração que se junta a outras que já conferem a este blogue uma dimensão que ele nem sonhou ter. E não esperas pela demora, companheiro: fico à espera de originais. Quando tiveres tempo, pachorra e disposição. Não escapas, camarada. Mas as coisas são o que são. Até o Fanha…

Um abração, Amigo, e o obrigado deste escriba. Só – e basta.

7 comentários:

Anónimo disse...

Excelente. Sou uma admiradora do José Fanha há muitos anos. Tudo o que faz - desde escrever a recitar, passando pelo desenhar - é muito bem feito. O Travessa do Ferreira marcou mais um tento. Parabens e obrigado, Antunes Ferreira.

Anónimo disse...

Gosto deste gajo. É porreiro. Boa aquisição. E por preço zero, um tal reforço é de parabenizar o AF.

Anónimo disse...

O Fanha é bom companheiro, o Fanha é bom companheiro; o Fanha é bom companheiro; o Faaaanhaaaaaa!!! A entrada do Fanha neste blog é muito importante. Goste-se ou não dele, o Fanha já faz parte, de pleno direito, da Cultura nacional. E, alem disso, é um grande ponto! Oxalá aqui fique por muitos anos!

Anónimo disse...

CARÍSSIMO ANTUNES FERREIRA E CARÍSSIMOS POSTANTES,

Muito agradeço as vossas tão simpáticas palavras. Gosto de estar aqui e farei o possível por dar uma perninha, uma mãozinha e o que que mais possa surgir.

Um grande abraço fraterno,

JFanha

Anónimo disse...

Não gosto deste blog, como já dise muitas vezes. Vou-o lendo e raras vezes fico sastifeito. Mas hoje, estou contentíssimo: o José Fanha de quem sou fã também já cá está. O A.F. assim começa a safar-se.

Antunes Ferreira disse...

Ó Fanha: o porco Casimiro roubou e publicou no infecto «Portugalclub» este teu texto. Mas não te preocupes: as acções ficam com quem as pratica. Diz coisas, Amigo

Anónimo disse...

Guardem as energias para continuarem aqui a por mais uns belos textos e porque nao memórias de vidas anteriores?

O Casimiro que se divirta mais o seu publico.