sexta-feira, junho 13, 2008
Transportadores rodoviários de mercadorias
Um morto - para quê?...
Antunes Ferreira
Sejamos francos: foi um episódio tristíssimo que se pode, inclusive, qualificar de criminoso. Dúvidas? Meteu morte, assaltos, privação de liberdade, alteração à ordem pública, foi contra a economia do País. É preciso mais? Além disso, veio, uma vez mais, trazer à superfície uma questão aparentemente colateral, mas incontornável. A saber.
Que raio de gente somos nós, os Portugueses? Já o escrevi, reescrevi e mantenho tudo o que expressei: salvo honrosas e bastantes, felizmente, excepções, nós não prestamos. Assim mesmo, soletrando: n-ó-s----n-ã-o----p-r-e-s-t-a-m-o-s. Se for necessário, exemplificarei noutro escrito o porquê desta afirmação. Para já, porém, não me afasto do que aqui me trouxe.
Se existe representatividade de organizações de classe neste País, ela tem de funcionar. Quero dizer, ela tem de responsabilizar pelos actos praticados pelos seus associados. E estes têm de proceder de acordo com essa relação. A não ser assim, para que servirão elas? Para serem desrespeitadas sempre que as partes assim o entendam? Pobres associações, pobre País.
A Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários de Mercadorias, Antram, terá de, a partir de agora, sublinhar que, supostamente, representa os… transportadores rodoviários de mercadorias portugueses. A Antram terá, presumo, de alterar os seus estatutos para incluir neles essa suposição. Caso estranho? Mas, bem vistas as coisas, o que é que não é estranho em Portugal?
Os transportadores rodoviários de mercadorias, vulgo camionistas ou proprietários de empresas de camionagem devem exigir da Associação que diz representá-los essa alteração estatutária. Ou, em alternativa, continuarem a marimbar-se para a dita e fazerem as greves, paralisações, limitações da liberdade rodoviária, até mesmo originarem a perda de vidas. Com Antram – ou sem.
Daí que talvez seja melhor, se é que isso ainda é possível neste País à beira-mar plantado, correrem os taipais da Associação a quem os associados não ligam peva. Isto é, para quem eles, camionistas/associados, se estão nas tintas. Se nem para conduzir uma greve legal a Antram serve, para quê continuar a dizer que existe e a ser negada durante três dias. Comparado com a auto intitulada Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários de Mercadorias, Pedro, o discípulo sobre o qual seria erigida a Igreja, foi um herói. Apenas negou Cristo por uns momentos. Nunca durante um tal lapso de tempo: mais de 72 horas. É obra.
Estou, convictamente, com a Constituição Portuguesa (apesar de ser Português…, e fazer parte dos que não prestamos. Excepções são outros). Estou, assumidamente, com o direito – contemplado no texto fundamental – à greve. Só as ditaduras, de direita ou de esquerda, o proíbem. E Portugal é uma Democracia e um Estado de Direito.
Nós, porém, esquecemo-nos quase sempre, mas sempre de acordo com as nossas conveniências, do binómio direitos-deveres. Os primeiros têm de cumprir os segundos. Naturalmente, a inversa é verdadeira. Mal seria que assim não fosse. Neste Portugal dos Pequenitos – não é o de Coimbra, do Bissaya Barreto, é este em que vamos sobrevivendo – isso não passa duma apetência – vaga. Lastimavelmente.
Não é caso virgem, recordo. Ainda recentemente, depois do Governo ter assinado com as organizações de classe dos professores um acordo que, ainda que provisório, poria fim, também transitório, à luta dos últimos e logo um grupo de mestres auto-proclamados independentes veio dizer que o dito entendimento não era para eles, porque não o reconheciam. Com Fenprof ou com… nada.
Greve selvagens são excrescências de um passado ditatorial e salazarento. No «Estado Novo» a greve era proibida. Donde, a necessidade de se enveredar por formas de luta grevista ilegalíssimas. Participei – e com alguma, pequena, responsabilidade – na greve estudantil de 1962 e, por isso, falo de experiência própria.
Mário Lino e Antram tinham chegado, ao fim de muitas reuniões e muitas horas, a um acordo que aparentemente punha fim à greve dos transportadores rodoviários de mercadorias. Mas foi necessário ouvir e convencer os mesmos para que findassem a paralisação do País. Que dizer mais desta cegada?
Ainda na quinta-feira fui esperar à Portela um amigo que vinha em voo directo de Viena para Lisboa. Directo, uma ova. Tiveram de parar em Barcelona, para… atestar o depósito. Estou a ver a cena: mire Usted, por favor. A llenar el depósito porqué en Lisboa no hay combustible o casi. Sin embargo, perdóneme por las molestias. Por supuesto. E, o catalão, recordando ao utente: Antenciò: no es permet fumar!...
Disseram as agências que o Executivo de José Sócrates preparava uma requisição civil. E – só? E a manutenção da ordem pública? E o exercício da autoridade democrática do Estado? E a liberdade de circulação? Revelo-me um autoritário? Um facho? António José Teixeira, jornalista de quem sou admirador confesso, não é autoritário, muto menos fascista. E, perante as câmaras da SIC, onde é Director de Informação, fez as mesmas perguntas.
Só me entristece saber que o inefável Portas igualmente o fez. Mas, o bom é inimigo declarado do óptimo. E, para terminar: no melhor pano cai a nódoa.
Também publicado em www.sorumbatico.blogspot.com
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