terça-feira, junho 12, 2007







Afinal havia outra


Pedro S. Guerreiro*
O
dogma da Ota caiu. O país saúda, porque sente que a escolha será mais acertada e porque se desvanece a imagem de teimosia do primeiro-ministro. Mas não é certo que Portugal tenha ficado a ganhar. Sobretudo se, como parece possível, é preciso que tudo mude para que tudo possa ficar na mesma.

A Ota tornou-se o tema forte da Oposição, uma repetitiva aliteração no seu discurso: a bota não bate com a perdigota; a anedota do deserto deu risota e foi a gota que faltava; até a Jota que ainda não vota pôs um camelo e uma gaivota a fazer chacota. E um estudo que se desencaixota o ministro boicota, o plano sabota e esgota uma rota em troca de uma derrota. Em vez de Ota! Ota! Ota!, agora é Alcochete que brota.

Pois é. Só que o assunto é mais sério do que todos os trocadilhos e do que a utilização política com que a Oposição reclama vitória. O Governo recuou. Mas recuou para quê? Para admitir mudar de opinião ou para saber desde o início que vai mantê-la livrando-se da pressão e da acusação de autismo?

O que mudou para que de uma semana para a outra o ministro que dissera que "a Ota é irreversível" reabra o processo? Que quem disse que a sul do Tejo "jamais" agora mande estudar Alcochete (que até está habituada a grandes especulações imobiliárias)?

Que quem tenha dito que ninguém consulta um engenheiro para saber onde se localiza um aeroporto agora entregue o dossier aos técnicos do LNEC? Que o Governo cujo primeiro-ministro dissera que parar para estudar seria um erro o faça agora? Que se adie a privatização da Ana? A Naer ainda pensa que estudar outras paragens "é um erro brutal"?

E os fundos comunitários, sempre ficam comprometidos, como se argumentava? E o que mudou para que as questões ambientais (aves que chocam com aviões, sobreiros a arrancar, aquífero a preservar) que eliminavam as hipóteses a Sul do Tejo percam a sua "condição mortal"? Mudou a pressão do Presidente da República. Foi Cavaco Silva quem viabilizou o fim do dogma. É ele quem gere sabiamente a relação com o Governo mas não se resigna e faz um discurso no 10 de Junho que de inócuo e irrelevante tem pouco.

Mas é inútil arremeter para o rol de derrotados José Sócrates e Mário Lino, colocando no pódio do dia Cavaco Silva, Marques Mendes, o bastonário Fernando Santo ou Francisco van Zeller, um evidente "cavaleiro branco" de lóbis que prefere não identificar (mas que a CIP não subscreve nem paga) porque, diz, assumiu esse compromisso com o primeiro-ministro.

O que interessa é se isto é ou não melhor para o País. Ninguém duvida que estudos nunca são demais. Nem que a ilusão dos consensos eterniza as não-decisões. E o pior de todos os cenários é o da não construção do novo aeroporto. Os estudos do aeroporto são uma boa notícia para o País. Mas podem ser uma vitória de Pirro. Porque ou tudo o que se disse nos últimos meses era mentira, ou este adiamento só serve para esvaziar um balão político que se encheu. Em qualquer dos casos, não é apenas um ministro que fica mal na fotografia.

(*Director do Jornal de Negócios)

NE - Cá temos o Pedro S. Guerreiro, de novo. O Editorial é de hoje, 12 de Junho. Creio que basta para que os leitores deste blogue vejam o que é escrever a sério sobre um tema tão quente como é o novo aeroporto de que Lisboa precisa como de pão para a boca. O texto assinado pelo Director do Jornal Económico diz quase tudo. Claro que muita água passará ainda sob as pontes. Mas, o enunciado é estupendo.

Amigos e Leitores: Para alem dos comentários que aqui queiram deixar, poderão escrever directamente para o Pedro Guerreiro, cujo endereço é psg@mediafin.pt, que, de resto, vem no quotidiano. Comentários são bem vindos, como sempre. Mas creio que o jornalista gostará de ter a vossa opinião. E, entretanto, leiam o Jornal de Negócios on line. A.F.

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