sexta-feira, março 10, 2006


Um país feijão-frade



O jornal «A Bola» publicou na sua última edição um curioso estudo de que me permito aqui transcrever uns excertos. Trata-se de uma comparação bem interessante, assinada por Hugo Vasconcelos entre os índices desgraçadamente negativos deste Portugalzito de trazer por casa com os resultados internacionais dos clubes lusos.

O antigo Condado Portucalense é o país da Europa a 15 – pois os dez novos membros não foram contabilizados estatisticamente pelo Eurostat – com menor rendimento interno bruto per capita; com a maior diferença entre os 20 por cento mais ricos da população e os 20 por cento mais pobres; com mais gente no limiar da pobreza; com menor taxa de produtividade e com mais jovens a deixar o ensino antes de terminada a escolaridade obrigatória.
Quer isto dizer: somos, realmente, o cu da União Europeia. E, pelo andar da carruagem, parece que isso não nos faz grande mossa...

Bem ao contrário, no concernente às futeboladas regista o jornalista que nas últimas quatro épocas, houve quatro países que conseguiram ter pelo menos uma equipa nos quartos-de-final de uma das competições europeias. Juntamente com a Espanha, a Inglaterra e a Itália – foi Portugal. Por incrível que pareça nem a França nem a Alemanha conseguiram isso.

Mas, pasme-se. Só um país esteve representado em finais europeias nas três últimas épocas. Portugal. 2003. Porto ganhou a Taça UEFA. 2004. O mesmo Porto ganhou a Liga dos Campeões. 2005. O Sporting perdeu a final da Taça EUFA. Mas, como diria o Senhor de La Palice... esteve lá. No Alvalade Séc. XXI.

Teremos, assim, um país feijão-frade? Ou, de tão estranho, nem leguminoso nem religioso? Ou, ainda, antes assim do que pelo contrário? Ou, assim, das duas, três? Ou, acentuando, um país Jeckill/Hyde?

Os mais bem intencionados podem refugiar-se nos calinos duas faces da mesma moeda, no antes de o ser já o era, nos brandos costumes que tudo aceitam, tudo admitem. Somos assim, conformados e esperamos talvez demasiado da Senhora de Fátima. Temos um clima excelente – alto lá, tínhamos – e feriados em número apreciável. E pontes.

Apetece-me dizer que somos um povo de caca. Gestas? Quais? Onde? Quando? Como? Aljubarrota? O Nuno Álvares Pereira ou a padeira? Os Descobrimentos? Vasco da Gama ou os escravos negros? 1640? Defenestrado o João Pinto Ribeiro ou o Miguel de Vasconcelos? O António Damásio ou o Herman? O Mourinho ou o Paulinho Santos? Que raio de terra, de gente, de país somos nós!...

O Povo afirma, zombeteiro, que os lusos são pobretes, mas alegretes. Às abissais desigualdades, às crónicas incapacidades, às desgraçadas auto-demissões, a tudo isso e mais ainda, contrapomos o nosso desenrascanço. E vamos vivendo, minúsculos, as nossas frustrações e, sobretudo, as nossas invejas micrométricas. Do Egas Moniz, dos Madre-Deus, da Amália, do Eusébio, do Manuel José. Do Saramago, não, que o gajo é comunista.

Chamem-me o que bem entenderem. A Liberdade também é isso, a Democracia também passa por aí. Ou deviam – mas isso são já outros quinhentos mil euros e 18 cêntimos. Pessimista. Derrotista. Traidor. Renegado. E mais. Desonesto, ladrão, videirinho, intriguista, mentiroso – isso não. Façam-me esse favor.

Pois então fiquemo-nos por aqui. Nem a sorte madrasta que traz o Barcelona à Luz, nem os treinadores holandeses, nem o Apito Dourado, nem a Associação dos Dirigentes Honestos (que ainda não existe no papel, mas já vive perfeitamente) podem fazer com que abdiquemos da nossa realização futeboleira. Nunca. Valha-nos isso.

Antunes Ferreira



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