quinta-feira, abril 06, 2006
O País está de Tango
Apareceram por Lisboa, principalmente nos murpis, novos anúncios de uma cerveja muito conhecida e muito consumida entre nós. Por certo que eles também proliferam pelo País, só que aqui à mão é mais fácil vê-los e apreciá-los. Trata-se de um cruzamento entre cerveja e... groselha. E, pelos vistos, a genética não tem nada a ver com esta bebida hermafrodita. Muito menos o falecido senhor Darwin, por mais que o copo pudesse ser considerado e integrado na teoria da evolução – bebedola...
Chama-se o produto Tango. E os publicitários, aproveitando-se de uma afirmação do senhor Durão B., hoje em Bruxelas e que então era primeiro-ministro em Portugal (acontece-nos cada uma) desarrincaram um slogan apelativo: O País está de Tango. Foi só mudarem o a por um o e o pobre Portugal lá volta à (má) ribalta. Não se sabe, porém, se, na EU, o antigo dirigente do MRPP tentará cobrar direitos de autor. E aos preços que se praticam na propaganda, mesmo entre nós, a bolada não seria de desprezar. Muito menos se conhece a opinião que poderia ter o também finado Mao Zedong.
Já havia botelhas de cervejola + gasosa. O chamado panaché engarrafado entrara no universo consumista dos portugas. Agora, o limão e a lima dão lugar à groselha. Não me admira se, mais dia, menos dia, sairá a público um enxerto cervejo-mazagrinesco. Para quem franza o cenho perante tal denominação, há que acrescentar que a só juventude dos admirados inquiridores poderá servir de justificação a tal atitude.
Isto porque, nos tempos em que o autor se dava ao luxo de ser puto, a malta dessedentava-se, para além dos pirolitos de berlinde, com a groselha, a limonada ou o mazagrin. Este era uma mistura de café (chicória?) com água, acurada q.b. e com umas gotas simbólicas de sumo de limão. Estava-se pelas décadas de 40/50. Quando apareceram pelo Jardim Zoológico os primeiros vendedores de esquimó fresquinho, foi uma festa – e um espanto.
Era um tempo muito especial, em que os benfiquistas eram encarnados porque não podiam ser vermelhos. Em que não havia suicídios, apenas cidadãos que se debruçavam exageradamente das janelas e varandas de um quarto andar qualquer. Em que os namorados, melhor, os conversados, tinham mesmo de conversar do passeio para a fenestra. Em que as jovens não podiam usar biquíni nas praias.
Contava-se, então, à boca pequena, a anedota daquela mademuázele francesa que, em Santo Amaro de Oeiras toma sol em tais preparos. Felizmente que um zeloso cabo-de-mar, zeloso guardião da moral e dos bons costumes, por ali passava. «A mademuázele não pode usar isso». «Isso, quê?». «Esse fato de banho». «E porrrquê»? «É um de duas peças, o que é proibido». «Entao senhorrr guarrda: qual delas querrr que eu tirrre»?
Era bem o tempo do quem não está connosco está contra nosco.
A mistura da cevada com a água, o malte e o lúpulo, convenientemente fermentada e para consumo humano, já tem mais de seis milénios. O pão líquido, como lhe chamavam os sumérios foi durante muito tempo utilizada como medicamento. Ou produto de oferta aos deuses. Os romanos que, de princípio, a desprezavam em detrimento do vinho, foram quem a levou para o Norte europeu, pois ali não se dava a vinha.
No caso vertente, a erudição sobre esta bebida alcoólica não é de encomiar. O Google traz tudo e ponto. Já a reflexão sobre a sua publicidade é outra coisa. Face à tão propalada crise que atravessamos estes milhentos anúncios pareceriam despropositados. Então – e o emagrecimento? Das pessoas, mas principalmente das empresas. A obesidade – de que o escriba é militante – reveste muitas formas. Combatê-la também.
No entanto, parece que até existe apenas uma. O que é estranho, dada a imensidade de produtos para perder peso que por aí pululam. Isto é que vai uma crise...
Antunes Ferreira
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